domingo, 29 de abril de 2018

VALE DE LÁGRIMAS



Que estranho e belo engenho o das lágrimas
De onde vêm?
Que secreta fonte subterrânea as contém?
Não sei.
Dizem ser um vale profundo e profuso.
E lá um rio se forma e se transforma
Em um mar de águas salgadas
Que acorrem quando chamadas.
Que rio é este? Que mar é este?
Existirá mesmo um vale de lágrimas?Não sei.
Só sei que quando nos falta a voz
As lágrimas falam por nós.



sexta-feira, 27 de abril de 2018

POBRETE, MAS ALEGRETE


            Ultimamente tenho estado mais emotiva do que nunca. Choro por qualquer coisa. Fui à manicure e enquanto conversávamos, falamos sobre desaparecimentos de pessoas e eu fui contar pra ela dos “Sobreviventes” dos Andes, lá pelos idos de 70. Em determinado momento eu me emocionei quando falei dos dois rapazes que haviam conseguido descer a montanha para buscar ajuda depois de três meses. Esfarrapados, com pouquíssimo peso, eles avistaram dois cavaleiros do outro lado de um riacho e gritaram por socorro, contando que eram do avião acidentado. Neste momento eu parei porque não conseguia mais falar. A manicure e eu derramamos lágrimas. Como é estranho e belo o engenho das lágrimas que vêm em socorro de nossas emoções lavando nossos olhos e nossas almas!
            Então, no documentário a que assisti, um dos sobreviventes de nome Fernando falava sobre o impacto de tal acontecimento em sua vida. E ele disse: “nós estávamos condenados à morte, haviam desistido de nos procurar”. Foi um verdadeiro milagre terem conseguido se salvar depois de muito sofrimento. O próprio Fernando teve a irmã ferida em seus braços por vários dias até que ela morreu, e a mãe já havia morrido na queda do avião. Eles não tinham nada, apenas escombros, neve, frio, fome e desesperança porque depois de certo tempo compreenderam que não viriam mais em sua busca. Num gesto extremo, dois deles, os menos fracos fisicamente, despediram-se dos outros e desceram os Andes sem qualquer preparo. Era a última cartada. Fernando comentou que qualquer pessoa com qualquer problema na vida pode encontrar uma saída. Eles não tinham saída. É fato que muitos estão condenados à morte por doença grave, na verdade todos estamos condenados à morte. Mas enquanto há vida, realmente há esperança.
            E enquanto estamos vivos, temos que procurar viver da melhor maneira possível, sabendo que a vida oferece infinitas possibilidades. Falo isto pra quem quiser ouvir e na verdade, falo pra mim. Porque sou pessimista, dramática e qualquer coisa pra mim vira um bicho de 777 cabeças. Se sou feliz, sou sempre boa, mas quando sou boa, nem sempre sou feliz, como dizia Oscar Wilde. Sou alegre até que aconteça uma coisinha de nada. Aí perco o sono e o humor. Recupero logo, mas fico abatida. E eu queria ser mais otimista, mais forte. Achei m a r a v i l h o s o  o que minha amiga Laís disse sobre a frase de Maria Lyra Pereira, já falecida. Ela foi uma poetiza de grande sensibilidade que veio morar e fazer poemas em Itajubá: “O por do sol não é triste ... é cor de rosa”. Pois é, eu queria aprender a enxergar cores e flores em meio às dores. Sempre depende de como vemos as coisas.
            Bem, mas por que o título “pobrete, mas alegrete”? você deve estar se perguntando. Porque no meio disso tudo lembrei-me de um fato relatado pela minha querida D.Cora. Em seu programa de televisão, Hebe Camargo contou que sua família era muito pobre. Quando ela e seus outros irmãos topavam com alguma comida tipo arroz com ovo, às vezes apenas pão, algo sempre simples, fechavam a cara. Mas sua mãe, uma mulher eminentemente maravilhosa, arrumava a mesa com todo o carinho, como se fosse servir uma comida para reis e rainhas. Ao perceber o desagrado das crianças, ela dizia com uma gentil autoridade: “Nada de chororô, sorriso nos lábios de todo mundo. Pobrete, mas alegrete”, insistindo com muito orgulho no lema que criou. Achei lindo!
            Mesmo ciente dos horrores da humanidade com tantos sofrimentos e misérias incompreensíveis, não posso deixar de me emocionar com tanta beleza que a vida nos oferece a cada segundo: o mistério das lágrimas que surgem de uma secreta fonte subterrânea, a lua que aparece no céu escuro, frases filosóficas, poemas sensíveis que gostaria de ter escrito, mães que cuidam para que seus filhos sejam felizes, a esperança dos que estão condenados. Mesmo sendo tão contraditória e fugaz, a vida continua sendo esplendidamente bela e intensa. 
            Alegremos e exultemos!         

domingo, 15 de abril de 2018

IDEIAS DE DEUS


IDEIAS DE DEUS
Misa Ferreira

Não é possível que este mundo tenha surgido espontaneamente
Como acredita quase toda gente.
Basta olhar em volta
A terra aqui, a lua ali,
Duas bolas girando suspensas no ar
A terra para morar
A lua para admirar.
E de vez em quando
Deus manda águas do céu para regar.
Também às vezes surge aí um arco de cores.
E as flores?
Escuro de noite, claro de dia.
E as estações que se alternam, pura magia!
O mar? Um grande mistério! Fala sério!
As ideias de Deus são geniais!
Foi Deus, ninguém mais!




NASCER E MORRER


NASCER E MORRER
Misa Ferreira

Dizem que a experiência de morrer é como nascer
Não sei dizer.
Não me lembro de ter nascido
Tampouco me lembrarei de ter morrido
Seja como for, é um caminho único e solitário
Uma canoa de uma só pessoa
Por mais que se queira ser solidário.
O que importa é que ao final a gente tenha vivido bem
Sem deixar se atropelar e nem ter atropelado ninguém.
Tenha procurado ser feliz
Ainda que a felicidade esteja por um triz
O que vier virá
O que tiver que ser será.
Por ora importa amar.
E pelo menos uma vez na vida, deixar rolar.

AO EROS COM CARINHO



Querida Lígia

Não somos donos de nada nem de ninguém. O Eros partiu hoje cumprindo sua missão aqui de eterno amigo e companheiro. Ao contrário das pessoas, ele não deixou nada que pudéssemos repartir, como roupas, calçados ou guardados. E, no entanto, ficou tanto dele dentro de seu coração. Como seria bom se pudéssemos deixar para quem amamos uma herança de um amor tão rico assim. Mas agora o momento é de dor, não poderia ser de outra maneira. A ausência do Eros na sua vida, assim como a ausência da Madona na vida da Agueda, deixou vocês perplexas, vazias, vulneráveis como um exército desfalcado. Não nos convence o argumento de que não deveríamos fazer luto pelos animais pelo fato de não serem pessoas. Não depende de nós, o luto é real e vou mais além, de acordo com o que já observei e atestei, esta dor pela perda de nossos pets às vezes é maior do que já sentimos pelos humanos que perdemos.
É que estes seres encantados, marotos, brincalhões, fidelíssimos, têm por nós um amor diferente de nossos pais, irmãos, companheiros e amigos. Seu amor é genuinamente puro, incondicional, sem julgamentos, único. Como bem disse Cristina Hauser para você, nossa relação de amor com os cães ou com qualquer outro bichinho está carregada de uma ligação especial, porque nós, humanos, somos diferentes. Carregamos tanta coisa conosco, não apenas materiais, mas um lastro de memórias, de sentimentos bons e maus, enfim vivemos com um fardo de tralhas atado a nós até à morte. E os animais nada carregam. Vivem o agora com intensidade, pureza e alegria, despojados de angústias futuras ou culpas. Por isso nos apegamos a eles, talvez quiséssemos ser como são. E quando se vão, basta uma única hora em que já não os temos para o mundo inteiro ficar vazio. 
Querida Lígia, o Eros, assim como a Joia e a Madona, estão no Céu dos cães, dos animais ou das pessoas, que seja. Por ora, para nós ficam a dor da saudade e o silêncio. O mesmo silêncio com que eles nos falavam, e nós sempre entendíamos, embora multiplicássemos nossas palavras como é próprio dos humanos. Como ainda estamos no mundo da matéria, a lembrança física é a que fica, a que dói. Quando estiver passeando com o Rajan, imagino que vá chorar muitas vezes lembrando-se do Eros que às vezes corria à frente, ávido por aventuras e, outras vezes, optava por vir mais atrás para se certificar de que você sempre estava presente ali, no comando. Afinal, nunca foi preciso a trela para prendê-los, os laços de amor e ternura sempre foram mais do que suficiente.
Boa viagem Eros. Valeu amigão!