Na semana passada, quando estava no
salão, entre cheiros de esmalte e com os pés descansando em águas tépidas, assisti
a uma propaganda no celular da minha manicure sobre um curso de desenvolvimento
pessoal, liderança e tal baseado na neurolínguistica. São desses cursos que
mudam radicalmente para melhor a vida de qualquer pessoa de qualquer idade,
trazendo à tona todo o potencial guardado e escondido que todos possuem. Bem,
eu nunca participei desses cursos, mas tenho curiosidade para saber como seria
comigo, embora eu já tivesse uma amostra disso. Remontei ao início dos anos 80,
quando fui fazer um curso de caixa em Brasília. Naquela época, fazer um curso
de caixa implicava conhecer muito mais do que simplesmente pagar e receber.
Hoje em dia acho que os cursos são feitos na própria agência. Mas era assim e lá
fui eu, morrendo de medo.
Foram
muitos dias de aulas em várias áreas como Grafoscopia, Psicologia, Matemática,
e outras que não me lembro. Havia uma área que penso que devia se tratar de
Relações Humanas, coisa desse tipo. Meus colegas eram funcionários do BB de
todo o Brasil, de Norte a Sul, de todos os cantos imagináveis e inimagináveis,
capitais e interior. Muitos eram extrovertidos, simpáticos, brincalhões, outros
mais comedidos e outros ainda quietos, preferindo a última fileira. Eu, uma
bobinha do sul de Minas, estava definitivamente enquadrada neste último grupo. Com
a idade melhorei um bocadinho, mas ainda sou muito assim. Vamos lá, um belo
dia, o tal professor de Relações Humanas inventou uma dinâmica com o grupo
dividido em equipes. Que sofrimento! Pensei! E foi proposto o seguinte:
teríamos dez minutos, não mais do que isso para montar uma peça de teatro. Cada
equipe teria que montar a sua e apresentar. Como? Uma peça de teatro montada e
apresentada em dez minutos? Seria possível?
Passaram-se
os primeiros cinco minutos e todos conversando displicentemente, sem se
importar com a tarefa e nem com o tempo. Foi me dando um frio no estômago, eu
olhava aflita para o relógio e pensava, “meu Deus, não vamos conseguir cumprir
a tarefa”, e responsabilidade sempre foi tudo pra mim! Quando vi que nada saía,
eu tomei a frente num ímpeto que me era até então desconhecido, algo como um
furacão que surge repentinamente ou um vulcão adormecido que explode. Eu disse:
“gente, vamos lá! Temos que fazer uma peça, temos que montar uma peça!” Todos
olharam para mim curiosos. E eu saí valente distribuindo os papéis e falas, fui
inventando um enredo qualquer, fui ensaiando cada um em seu papel. Nos últimos
segundos chegamos a ensaiar grotescamente a minha peça. Eu no papel principal,
é claro! Eu merecia, não é? A história era mais ou menos a de uma mulher que se
despedia do marido toda carinhosa e em seguida entrava em cena seu amante
igualmente carinhoso. Não sei sinceramente de onde fui tirar essa ideia, talvez
algum quadro de programa cômico daquela época. Havia uma garota que fez um
papel do qual não me lembro também. Meu amante era um nordestino arretado que
adorou a brincadeira e fez o papel exagerando tudo. A equipe achou graça e
rimos muito. Tudo foi feito em quatro minutos. No tempo exato, soou o apito do
professor e ele pediu que as equipes se apresentassem. Resultado: apenas a
nossa havia cumprido a tarefa à risca. A turma toda aplaudiu. Eu dei o máximo
de mim no papel da mulher traidora, tipo assim Fernanda Montenegro em seus
melhores dias e arranquei efusivos aplausos. Digna de Oscar.
Ao
final da aula o professor perguntou se tínhamos alguma noção por que tivemos
que fazer aquilo. Não sabíamos de nada e ele explicou: “pessoal, não se trata
de caçar talentos, se bem que tem gente aqui (apontando pra mim) que está na
profissão errada, devia se apresentar na
Globo! O que eu quis ver é como estava o espírito de iniciativa e liderança de
vocês. Não importava o que apresentassem, não era a atuação de artistas, mas de
pessoas que sabem improvisar em tempo escasso, e fazer acontecer. A única
equipe que fez foi a deles, parabéns para eles”. Palmas e palmas. (Para mim!!!)
E
eu fui para o hotel simplesmente sentindo-me encantada com a vida, pensando,
“eu sou uma líder, eu tenho iniciativa”, constatações e afirmativas que no
momento valiam mais do que estar de posse de tesouros materiais preciosos. Sentia-me
feliz, não conseguindo tirar dos lábios um sorriso amigo e matreiro!. Nunca
mais me esqueci disso, afinal como esquecer o momento mágico em que descobrimos
que dentro de nós mora uma outra destemida que é capaz de quebrar paradigmas?. Nascia
meu ideal de Amelia Earhart que ansiava por rasgar os céus em voos
maravilhosos. Marcou. Fica registrado aqui. Sou uma pessoa de iniciativa, sou
uma líder! Enquanto leio este último final, sei que o sorriso amigo e matreiro
está em meus lábios! Se minha mãe pudesse ler isso agora estaria dizendo: “como
é bobinha ....”