terça-feira, 13 de março de 2018

Prefácio do livro NINGUÉM NASCE A PASSEIO



PREFÁCIO

“As palavras querem voar como os passarinhos,
Desabrochar em uma margarida.”
(Debora Laurito Friend)

Fôssemos pássaros, talvez não precisássemos de poesia para viver. Voaríamos livremente pelos céus degustando poeticamente a beleza do mundo. Assim, porque nos faltam asas, alimentamos nosso espírito com os poemas que dizem o que sentimos e o que não sabemos como dizer. Há poemas que traduzem tão exatamente o que nos vai na alma que me pergunto onde os poetas conseguem a chave desse dizer encantado, elevando-nos nos ares e nos propiciando ver a beleza e a profundidade dos dias supostamente banais.   
Debora Ferreira Laurito Friend tem a chave do dizer encantado. Diz o que está dentro de nós e não sabemos como externar. Suscita em nós o desejo de escrever, não propriamente o que ela diz tão bem e nem como diz, mas simplesmente aflora em nós o desejo de poetar. “Ninguém nasce a passeio” é um livro que reúne preciosos poemas filosóficos cheios de leveza, apresentados numa linguagem simples e encantadoramente lírica. Debora é poeta, enxerga o mundo com um olhar sensível e sagaz e com o tal dizer encantado nos revela a grandiosidade da vida presente nas questões cotidianas e nos questionamentos humanos. Por isso seus poemas também são profundos e nos fazem refletir sobre a imprevisibilidade da vida e a permanência das incertezas: “Deem-me o direito de não saber! ... Aonde vão com tanta coerência? ... Nosso destino é o mistério.” (Dúvidas) Ou “Sim, eu escolhi a solidão profunda, a imaginação viva e o coração cheio de porquês!” (Felicidade X Verdade).
“Seu direito de não saber” está sempre presente como no estranhamento de si própria: “Posso lhe dizer todos os meus sonhos ... posso lhe abrir todos os meus diários, meus cadernos de poesias ... Posso lhe dizer tudo o que sei, ou que acho que sei. Será que sei? Não sei.” (Quem sou eu?) E ao tentar saber, a resposta se desvanece no ar: “mais eu me estico para agarrar a resposta que foge de mim, como bolhas de sabão”. (Poema sobre sílabas soltas e bolhas de sabão).
Ora ela questiona os verdadeiros valores: “Ser rico de dinheiro nenhum, ser pobre de mão vazia, ser próspero de cores azuis ... Eu quero mesmo poder herdar o arco-íris.” (Uma herança para vida).
Ora constata a inconsistência das verdades que nunca serão permanentes: “Minhas verdades mudam e por isso eu as carrego na mochila. Tenho as mãos livres para recolher as pedras do caminho e quem sabe, as conchas da praia que se aproxima.” (Certas verdades).
“Ninguém nasce a passeio” nos alerta para a inexatidão da vida, das verdades e das certezas. Por outro lado nos alerta para algo que sem dúvida é absolutamente exato: a estonteante beleza do mundo, mas para enxergá-la torna-se necessário “ter olhos e ouvidos que se abram, basta crer”, nos diz Debora em “17 horas”. E há outra certeza para Debora: “Refletindo sobre minha missão de vida, me decidi: quero ser uma catadora de sonhos”. (Ninguém nasce a passeio)
Os poemas de Debora vão na contramão da vida comum, robotizada, da mesmice dos dias. É preciso “contemplar o silêncio”(Poema sobre sílabas soltas e bolhas de sabão), “encontrar sentido nenhum ... não prestar atenção nas horas” (Viver).
“Ninguém nasce a passeio” nos apresenta um mundo difícil, que “parece feio”, porém  pode se tornar belo se tivermos olhos para contemplá-lo nos detalhes, “ainda que o asfalto seja quente e queime a pele” (Ecdise, quando a serpente resolve mudar). Fica patente em todo o conjunto de poemas de Debora que existem duas realidades: a real, cotidiana e áspera em que há um chão onde nossos pés são feridos pela brutalidade do caminhar. Entretanto, como universos paralelos, há outra realidade, a que existe acima de nós, a das alturas, para onde podemos voar e tal como os pássaros, enxergar o mundo sob outra ótica, aquela dos sonhos, dos devaneios e fantasias, onde podemos tocar as cores do arco-íris, saborear a mágica dos momentos “para nutrir-me com o que basta: “Poesia, único alimento para a vida.” (Banquete)
Tenho certeza de que os leitores vão se encantar com os poemas de Debora, talvez até possam voar em suas asas, embora ela continue esperando por elas: “Estou constantemente a ponto de cair, até o dia em que eu crie asas.” (Por um triz)
E nós podemos ter outra certeza: enquanto Debora tiver asas e cumprir sua missão de uma catadora de sonhos, seremos presenteados com belos poemas!
             

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