Um dia
desses atrás meu marido foi supervisionar o trator que iria aplainar o terreno
onde será nossa nova casa. Nem sei se aplainar é o termo correto, de
construções nada entendo, quero dizer, construções de tijolos, cimentos, telhas
e outros itens assim. Construo textos e poemas, mas isso é outra coisa. O
trator trabalhou um dia inteiro e no dia seguinte choveu. E no outro dia
seguinte também. Ele voltou com as botinas enlameadas e eu disse: Bem, deixe as
botinas aí fora como no tempo brabo da pandemia, nem pensar em trazer lama para
dentro. Enfim, enquanto lavava a louça, pensei um tanto apreensiva. Uma nova
casa, um novo lugar, logo eu que sou tão conservadora. Mas a casa está dentro
da gente como o amor está dentro da gente e como a felicidade também está. A
casa é toda a gente.
Vou
cultivando sonhos e desejos. Vou querer floreiras nas janelas, coisas que não
se pode ter em apartamento. Também vou querer um balanço desses antigos na
varanda e uma pequena lareira, sempre quis uma lareira e nunca é tarde para se
ter uma. Também uma nova estante de parede inteira para meus livros amigos e
uma poltrona dessas confortáveis para ler. Nossos quadros irão para novas
paredes, e quando eu os olhar, pensarei em todos os lugares onde já morei. Não
sou tão apegada assim, tenho quadros novos, mas gosto dos antigos, eles fazem
parte de lembranças inesquecíveis. Já sei que a casa construída não será
grande, o terreno é pequeno, mas não tão pequeno que não comporte uma árvore no
quintal, canteiros de tomatinhos, salsinhas, cebolinhas, o pé de louro e
plantas, muitas plantas e flores de infinitas cores, afinal teremos terra no
chão e não apenas em vasos como é aqui. Porém tenho que admitir que sentirei
falta de onde moramos há tantos anos. Tanta vida vivida, tantas lembranças, mas
só gratidão por tudo. Afinal, ser peregrino e não se sentir dono de nada é o
segredo. Levamos a esperança dentro do coração.
Como
podem ver, já viajei anos-luz nos planos para a nova casa. É preciso coragem
para mudar depois de mais velhos, mas a vida é mudança. Serei corajosa como fui
quando deixei a casa de meus pais e não foi para casar, foi para viver sozinha,
alçar voos intrépidos como a corajosa Amélia Earheart, ou como a corajosa Elsa
Wolcott de “Os quatro ventos”. “Seja corajosa, lute sempre para ser feliz”. E a
gente tem mesmo que ser porque a vida exige assim. E depois, para quem nasceu
com asas e ânsias, não é bom ficar sempre no mesmo lugar.