sábado, 28 de novembro de 2020

AFEIÇÃO

 


Afeição tem que ser construída

Como tudo na vida

Ai de quem pensa que não

Se não se constrói a afeição

Tem-se apenas a obrigação

 

Afeição requer cuidado

Às vezes redobrado

Afeição requer paciência

Tolerância e indulgência

 

É difícil, porém possível

Recuperar a afeição perdida

Quem sabe até a não construída

Depende do perdão

E de cada coração.

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

QUERIDA FLORZINHA


Querida florzinha

Há muito que te procuro

Tens muito a me ensinar

És tão pequena, tão sozinha

E tão pronta pra amar

 

Quero aprender o segredo

De ser só e não ter medo

Se tiver o que é que tem?

Sou sozinha também

O poeta é sempre só

Ou finge que é

Não sei bem

 

E a florzinha respondeu:

 

Querida irmãzinha

A vida passou, poucos dias vivi

Muitos sonhos perdi

Entre ciscos e pedras nasci e cresci

Mas cumpri o meu papel

Com o vento e a água do céu

Sejas pequena

Sejas simples, estejas bem

É feliz quem ama o que tem.

 


O SAGRADO SILÊNCIO (SILÊNCIO DE OURO)

 


Outro dia eu segui a orientação de minha irmã e fui assistir no youtube a um vídeo que falava sobre o Milagre Eucarístico ocorrido em Itaúna, acho que em 2004. A sacristã e Ministra da Eucaristia “Fia” relata os detalhes que envolveram o milagre. Ela foi a pessoa diretamente ligada ao fato, pois foi quem viu pela primeira vez o vidro com água que continha as hóstias consagradas transformadas em água sanguinolenta e pedaços de carne, tal como ocorreu no Milagre de Lanciano. Evidentemente que qualquer relato envolvendo o Milagre Eucarístico é comovente. Faz a gente ficar pensativa e meditar sobre o que não pode ser explicado pela ciência. Mas o que me moveu a escrever foi sobre a pessoa da Fia.

Fia é pessoa simples, direta, não se preocupa com sua imagem. Fala bem, explica como se estivesse contando o que ocorreu para uma pessoa da família. No momento em que ela se deparou com aquela cena, ela soube imediatamente que caberia a ela guardar em seu coração este segredo para só relatar ao Pároco que por sua vez iria relatar ao Bispo, tudo a seu tempo. Todo o cuidado com a beleza e santidade do fato seria pouco. É claro que chegaria o momento em que todos na cidade, no país e no mundo ficariam sabendo. Mas naquele momento era necessário o silêncio. E Fia guardou este silêncio como um tesouro. “Nem para minha mãe”, disse ela. O silêncio é um tesouro.

E quando Deus se manifesta, Ele sabe para quem, Ele escolhe. São pessoas predestinadas, santas ou a caminho da santidade. Deus conhece as pessoas para quem distribui pérolas. Ele sabe de todas as coisas. E eu que falo tanto, vou aprendendo a falar menos, a falar o essencial, não falar o que não é preciso. Já me arrependi muitas e muitas vezes por falar demais. 

O silêncio me fascina porque ele já carrega algo de sagrado. O silêncio se preenche. Não há necessidade de falar. Um tempo de silêncio é um tempo sagrado. Penso muito no silêncio de Nossa Senhora que em tudo pensava e guardava em seu coração. Penso no silêncio dos santos. Penso em Santa Teresinha que dizia: “Bendito silêncio que tanta paz infunde na alma.”

Ninguém disse a Fia que ela deveria manter o milagre ainda escondido. Ela sabia em seu coração. Fiquei emocionada com o milagre e com a pessoa da Fia. Gostaria de ser como ela. Quando ela conseguiu achar o padre e o levou até à Sacristia, ao mostrar o vidro, o padre ficou perplexo, qualquer pessoa ficaria. Ele precisou se sentar. Mas Fia não se abalou nem um instante. Ela disse algo como: nunca tive nenhuma dúvida de que Jesus está na hóstia consagrada, portanto, nada mais natural do que o sangue e carne estarem ali presentes. Ela se ajoelhou diante do vidro com água e sangue da mesma maneira que sempre se ajoelhou diante da hóstia consagrada.  

A quem interessar, assista ao depoimento de Fia depois de dezesseis anos do milagre ocorrido. Encantou-me o silêncio da Fia. E finalizo com Santa Teresa de Ávila que ainda hoje li, sobre a Regra de sua Ordem: “No silêncio e na esperança estará a vossa fortaleza.” (Isaias, 30,15)     

ADORÁVEIS MULHERES

 


Tenho quatro primas que são quatro irmãs inseparáveis. Cada uma mora em uma cidade, mas sempre que possível elas se encontram, ora em casa de uma ou de outra. Quando elas têm um fim de semana inteiro para estarem juntas, é uma festa. Falam de tudo, riem muito. São espirituosas, alegres e engraçadas. Suas filhas e sobrinhas adoram estar presentes para ouvir as prosas.

Na minha família somos três irmãs e uma mora bem longe e quando vem, também é uma festa. Nossas conversas vão de lembranças, de receitas, de cães e gatinhos, de tudo. Falamos muito das coisas de Deus, dos santos e piedades. É tão bom!

Certa vez uma amiga me contou que sua mãe quando encontrava as irmãs e eram muitas, a alegria era tão grande que elas ao longo da vida desenvolveram uma linguagem própria, coisa de linguística mesmo, de assustar os estudiosos da matéria. Falavam e só elas entendiam aquela linguagem de amor e alegria!

As famílias eram numerosas nos tempos antigos e assim, as irmãs também eram muitas, mas eu sempre me lembro de Nossa Senhora que sendo filha única visitou Santa Isabel, sua prima, e como devem ter conversado naqueles meses!

Outro dia, li no Medium, plataforma americana onde também posto crônicas, li um artigo que me emocionou. A autora conta que faz parte de três gerações de mulheres que se reuniam, avós, mães e filhas, ao redor de um bordado imenso que rodeava uma grande mesa. Ali todas juntas, elas falavam de tudo como nós aqui. Cada uma trazia seu material e a colcha bordada era chamada de “Crazy Quilt” (Colcha louca). Elas conversavam, riam e às vezes choravam. A tradição acabou com a morte da última avó na década de 80. Ela comenta sobre a sabedoria que ganhou das nove mulheres que mantinham vivas a colcha e a amizade. 

Reflito também sobre as lavadeiras de antigamente que lavavam as roupas no rio, levavam aquelas tábuas tanquinho. Como riam, como falavam, como cantavam, às vezes também choravam. Tudo com o ruído da água que passava. A vida era difícil como ainda é, só que essas mulheres, quando se reuniam, eram felizes.

Percebo que as mulheres são mais unidas, mais cúmplices, mais fraternas, é da nossa natureza, somos assim, sensíveis, acolhedoras. Sentimos coisas milenares, inomináveis. Podemos carregar dores inconsoláveis em silêncio, choramos sempre, mas também podemos tagarelar um dia e uma noite inteira, rir até cansar. Trazemos sabedoria e fortaleza dentro de nós desde que nascemos. Sabemos consolar umas às outras. Somos seres especiais, somos a alma da família, a alma da casa. Mia Couto que o diga:

- Tenho saudades de minha casa, lá na Itália.

- Também eu gostava de ter um lugarzinho meu, onde pudesse chegar e me aconchegar.

- Não tem Ana?

- Não tenho? Não temos, todas nós, as mulheres.

- Como não?

- Vocês, homens, vêm para casa. Nós somos a casa.

(Extracto de um diálogo entre o italiano e Deusqueira – O último voo do flamingo, Mia Couto)

 

            Nunca vou me esquecer de uma amiga que fez o seguinte comentário: “Se as mulheres governassem o mundo, não haveria guerra” (Elika Takimoto)

   

PRIMAVERA/VERÃO

 

PRIMAVERA/VERÃO

Misa Ferreira

 

É Primavera

Não fosse pelos Lírios da Paz

Eu diria que não era

É preciso não se esquecer dos Beijinhos

Mas beijinhos sozinhos

Não fazem a estação

Por aqui estão e sempre estarão

Mas os Lírios e a Paz ...

Pode ser que não. Nunca mais.

O mundo está mudando

Temo que a Primavera

Venha a ser uma quimera

Não importa

Sempre estaremos à espera

Das flores com todo o coração

Pois esta Primavera já vai virando Verão.

CAPITÃES CORAJOSOS

  

“Harvey Cheyne é um menino mimado que recebe duras LIÇÕES DE VIDA depois de cair no oceano e ser resgatado por um barco de pesca.” Assim está escrito na sinopse do filme: CAPTAINS COURAGEOUS, de 1996. Normalmente fujo dos filmes antigos, prefiro os atuais e como sempre, ao radicalizar, acabo perdendo preciosidades. Felizmente esta preciosidade não perdi e recomendo. Chorei muito, não de tristeza, e sim de pura emoção. Este filme é um ensaio sobre a bondade.

Cansada de assistir a tanta violência, tanta banalidade, tanta bobagem, tanto egoísmo, de repente dou de cara com um clássico que ensina verdadeiras lições de vida, um aprendizado sobre a amizade, bondade, dignidade. Este filme me emocionou muito, me deu coragem para viver nesses tempos difíceis que vivemos, diante da valorização do que não tem valor de fato, diante do isolamento, do medo, das adversidades.

Não posso falar muito do filme porque isso não se faz. Quem não assistiu, vai querer assistir, assim, tomarei cuidado para não contar tudo, se bem que, mesmo que eu contasse tudo, minhas palavras nunca seriam totalmente fieis, nunca fariam jus à beleza do filme. Como dito na sinopse, Harvey é um menino riquinho e mimado de quatorze anos que cai de um navio e é resgatado por um barco de pesca, comandado por um capitão digno e corajoso. Harvey conhece Dan, o filho do capitão, um aprendiz de pescador de dezesseis anos, um garoto muito bom, que aprendeu o ofício com o pai e os pescadores. O que é marcante em Dan é sua bondade, sua humildade. Eu me encantei com o Dan.

O barco de pesca ainda vai ficar no mar por alguns bons meses e Harvey não tem opção senão trabalhar para comer, como todos os outros que receberão seus salários ao final da viagem. Arrogante, o menino rico quer pagar ao capitão para desviar sua rota e suspender a pesca para levá-lo a Nova York. Aos poucos, Harvey vai aprendendo a ser grato, a pedir desculpas e, acima de tudo, vai aprendendo o valor de uma preciosa amizade e nisso Dan tem um papel fundamental.

Harvey aprende a pegar seu primeiro peixe, a manejar o leme, a limpar o barco. Ele vai se transformando pouco a pouco, e tem coisa mais bonita de se ver no mundo do que a transformação de uma pessoa? Já aprendi que os milagres podem acontecer instantaneamente, mas às vezes os milagres têm que ser construídos e isto também pode levar algum tempo, até uma vida inteira. Dan sempre intercedia por Harvey junto ao pai durão, e o Capitão lhe disse: “quando ele chegou, sabia de todas as respostas, depois foi aprendendo a fazer perguntas.” Harvey aprende muitas lições e entre elas, que há momentos e lugares em que o dinheiro não vai servir para nada.  

Os dois garotos se tornam grandes amigos e trocam confidências. Dan dá de presente a Harvey o que ele tinha de mais caro, afinal, os verdadeiros amigos sempre fazem isso. Harvey aprende o valor da humildade, do respeito. Importante mencionar a bondade dos pescadores, a convivência fraterna e alegre de todos eles. Que beleza, gente!

Será que estou tão carente assim de bons valores, de sentimentos bons? Ah estou sim. Não só eu, o mundo todo.  Tudo muito bonito. Vale a pena. Como diz o povo: Super recomendo. Você corre o risco de chorar, mas não de tristeza, mas de beleza e de emoção. Embarque nesta viagem e se encante.

    

INOCÊNCIA E PIEDADE INFANTIL

 

 

Nada me comove mais do que a piedade infantil, a inocência bendita! Na “História de uma Alma”, Santa Teresinha conta que bem pequena viu um pobre velho que penosamente se arrastava em duas muletas. Correu ao seu encontro e quis dar a ele seu “vintenzinho”. Para surpresa dela, ele recusou, mas lançou a ela um triste olhar e um doloroso sorriso. Santa Teresinha era muito pequenininha, mas recordou-se de ter ouvido dizer que no dia da Primeira Comunhão alcançavam-se todas as graças pedidas. Ela guardou em seu coração a promessa de pedir pelo pobrezinho e cumpriu este pedido daí a cinco anos, quando então fez sua Primeira Comunhão. “E sempre cri que a minha prece infantil por esse pobre homem tivera a benção e recompensa do Céu.” Disse ela.

Hoje, assistindo ao Terço pela Canção Nova, percebi que a moça que sempre está lá dirigindo o terço havia levado sua filhinha. E a menina foi contemplar o último mistério. Como toda criança, comeu algumas sílabas, engasgou, e achei uma graça quando ela repetiu dez vezes: “Bendito é o fruto do “nosso” ventre”. Ri muito.

E não pude deixar de me lembrar, sorrindo sozinha, quando minha sobrinha pequenininha rezava o final do Pai Nosso: “Não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do ‘LOBO MAU’. Amém.” Tudo na maior seriedade. Um amor!

Meu irmão mais novo, na época, com seis anos talvez, chutando bola no corredor de casa acertou um lindo crucifixo de gesso com o rosto de Jesus em dourado. O gesso espatifou-se pelo chão. Minha mãe veio correndo da cozinha e já encontrou meu irmão arrasado, vertendo lágrimas sem remédio, com o rosto vermelho, como me lembro disso! Ele chorava copiosamente, não por medo de levar uns tabefes, mas por ter machucado Jesus. Minha mãe bem que queria partir para uns tabefes, mas devido ao estado lamentável do meu irmão, ela não teve outra coisa a fazer a não ser consolá-lo. Era real para ele que Jesus havia sido machucado. Fico pensando em Jesus sorrindo com carinho para aquele menino que ele era.

Santa Teresinha já era santa quando menina, já era predestinada, mas sua vida não foi mais fácil por isso, pelo contrário, foi muito difícil (“Não imaginava eu então que para chegar à santidade, fosse preciso sofrer tanto”). Entretanto, quando criança, era uma menina ativa, feliz, espirituosa, voluntariosa, fazia mil perguntas para a mãe, era mimada por todos. Falava muitas coisas bonitinhas sobre o Céu. 

A infância é receptiva e sábia, marcada pela intuição. Não é por acaso que Jesus aconselhava que acolhêssemos o reino de Deus como uma criança. Quando nos tornamos adultos, vacilamos na fé. Vamos caminhando sobre as águas, mas tal como Pedro, quando o vento fica mais acirrado, somos tomados pelo medo e afundamos. Já não podemos mais contar com a sagrada inocência da infância em que todas as coisas são possíveis.

Se a gente não se fizer criança, a vida ficará difícil, seremos estranhos num mundo cada vez mais estranho e impossível. Não podemos também mais contar com o colo dos pais, mas temos os braços do Pai do Céu para nos acolher. 

Feliz Dia das Crianças para todos nós!

 

 

 

 

 

CELULITE - Luta inglória

 


Sempre convivemos bem, eu e a celulite. Ela, bem longe de mim. Eu a conhecia de outras mulheres. Vista assim de longe, eu sempre achei feio, mas não era comigo, então eu não sentia na pele. Quando as mulheres reclamavam perto de mim, eu dizia, “bobagem, toda mulher tem”. Aí me chamavam atenção, “você não tem”. E eu fazia um ar bobinho de sem graça. É fato, eu não tinha celulite até os quarenta e tantos.

Eu era lisinha, firminha, bonitinha. E sinceramente eu achava que nunca teria celulite. Por volta dos cinquenta, a coisa foi degringolando, mas era pouco. Assim mesmo, batalhei contra ela. Fiz isso, mais aquilo, bota gesso, corrente russa, mandei vir do Canadá uns cremes sofisticados. Prometi a mim mesma que a venceria. Bem, batalhar contra a celulite é uma luta inglória! Para ganhar eu teria que amanhecer e dormir na estética, ganhar três vezes mais e ser muito persistente. Teria que mudar minha alimentação, fazer exercícios a contento. Ah, envelheci, dá licença? Quero curtir mais a vida, me dar ao luxo de comer doce, de ficar de bobeira, exercício físico, tá bom, a gente precisa, mas nem tanto.

Enfim, eu ainda batalhava, mas acabei apelando para uns cremezinhos mais baratinhos, numa ilusória esperança de que a celulite não aumentasse, quem sabe né? Capaz! Qual o quê? Depois dos sessenta fui covardemente massacrada e vencida pela celulite. Foi ladeira abaixo. Eu me olho no espelho e digo: ah Misa, que feiura! Aí a outra de mim fala pra mim: azar Misa, não tô nem aí. Já tenho idade, deixa rolar, há outras belezas a serem cuidadas, inclusive a beleza interior. Ah, mas eu queria ser como era antes. Impossible! Eu me rendi. Não se pode vencer toda guerra. Todo mudo envelhece. A gente pode e deve ficar bem cuidada, mas jovem nunca mais.   

Meu marido me consola dizendo que se eu fosse uma alienígena reptiliana eu não precisaria ficar preocupada com massagens ou cremes caros, pois o casco de réptil é imune à celulite. Prefiro a celulite. Ele, sempre carinhoso, ainda diz: deixa de ser enjoada, uma celulitizinha de nada! Quem ama, ama! Tá barrigudo, mas é feliz! É que homem é diferente de mulher.

Sou vaidosa, confesso. Não queria ser, mas sou. Há muitos anos conheci uma fisioterapeuta que me atendia. Ficamos amigas, e admirada, percebi que em seu cantinho simples, quase espartano, não havia enfeites, sequer um espelho!  Ela riu muito, me contou que sua mãe veio visitá-la e ficou brava com ela, por sua falta de vaidade. Senti uma santa inveja, se é que a inveja pode ser santa. Queria ser despojada assim, mais livre, sem querer me ver de perfil, coisas de mulher vaidosa. Acho bonito, honestamente.

A gente vai aprendendo. A idade chega e ensina. Ainda bem.