sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

QUARESMA




E já chegamos à Quaresma deste ano. Incrível, ontem mesmo era Natal! Depois das festas carnavalescas entramos nos quarenta dias de reflexão. Ontem, assistindo à missa da 4ª Feira de Cinzas, ainda comentei com minha irmã, como gosto deste tempo, das cerimônias na igreja, das músicas! As músicas de Quaresma, a Ladainha de Todos os Santos na missa da Páscoa, aquela em que os ministros vêm aspergindo água benta com galhos e todos cantando: “Banhados em Cristo somos uma nova criatura, as coisas antigas já se passaram, somos nascidos de novo, aleluia, aleluia ...”. Que beleza! Como dizia minha mãe. Agradeço a Deus pela semente plantada por ela, de como fomos com o tempo resgatando tudo o que ela prezava! Fomos juntas algumas vezes a missas de Páscoa, e a emoção da hora em que apagam as luzes, todos com velas acesas, depois acendem as luzes, os sinos repicando.  Não tem preço essa beleza toda. É como quase estar no Céu!
Bem, mas até chegar à Semana Santa propriamente dita e à Páscoa, temos a caminhada das reflexões, as vias sacras, as matracas. O difícil são as penitências, sacrifícios e jejuns. Minhas primas, mais piedosas que nós, não comiam doce ou carne na Quaresma. Penso que com a modernidade outros sacrifícios são também valiosos como privar-se da televisão, dos filmes, da Netflix e afins, mas confesso que nunca faço. E o que tanto os pregadores recomendam, o jejum da língua, o silêncio, o mais difícil. Não falar dos outros, guardar no coração. Intenção é o que me sobra. Contudo, o que Deus mais quer de nós é um coração alegre e que confiemos em sua bondade, faça chuva, faça sol. E olha que às vezes faz mais chuva.
Sou encantada com o mundo, não é para menos, o mundo é de Deus. Falo mundo no sentido da natureza, das estações que se alternam, da chuva que cai do céu, das flores, da lua tão pertinho de nós girando em volta da terra e girando sozinha, das criaturas, dos sentimentos que nos emocionam, das lágrimas que em seu estranho e belo engenho afloram das nossas fontes subterrâneas. Como não me lembrar que fomos idealizados e criados por Deus. Sou encantada com o mundo e também sou mundana. Gosto de guloseimas, de vinho, de filmes, de viagens, de compras. Pendo para um lado, pendo para o outro. Contudo, sou eterna apaixonada por Jesus.  
Leio Saramago, Mia Couto, Graciliano Ramos e também Santo Agostinho e as duas Teresas. Sei na ponta da língua e do coração o que disse uma e o que disse outra, se bem que ambas nos ensinam a chegar perto de Deus. Os santos são nossos amigos e professores que nos ajudam na caminhada. Contemplo, emocionada, as feições serenas de Santa Catarina Labouré e Santa Bernadete em suas urnas. Há nelas algo que eu nunca teria, mas queria. Não, não devo dizer nunca – o caminho da santidade é aberto, livre a todos, não há nada que nos impeça. Basta um desejo e uma vontade forte e plena de querer a Deus.
Santa Quaresma a todos!       

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

O ENCANTO DAS PEQUENAS COISAS



Por que será que as pequenas coisas sempre se revelam maiores do que as grandes? Isso me vem à mente sempre que, desanimada, me esquivo de lavar a louça do café como se fosse a cozinha lotada de louça suja do Palácio de Buckingham depois de um grande jantar para Chefes de Estado. E quando aqui em casa temos mais pessoas para um almoço e eu me deparo com o caos total de panelas e pratos, não quero que ninguém me ajude. Sou tomada por uma energia inexplicável, boto a mão na massa e logo tudo está organizado e limpinho. Mas o café da manhã? Fala a verdade, duas xícaras e pires, alguns pratinhos, copos, uma frigideira, algumas colheres, garfos e facas, farelos de pão, nossa! Quero chorar de preguiça!
Adoro essas contradições da vida.
Bem, é verdade que também tenho preguiça de arrumar a cozinha depois do almoço. Tenho que confessar que sou preguiçosa sim. Assumo. Contudo, já adotei um método muito eficaz para que toda a arrumação passe num piscar de olhos e exponho aqui meu segredo. Eu canto. Minha hora de lavar os pratos, panelas e tirar a gordura do  chão e do fogão é a hora de cantar e de oferecer. Isso de oferecer foi minha irmã que me lembrou, mas é verdade sim, coisa dos antigos que ensinavam: “oferece ... oferece a Deus qualquer mínimo sacrifício que seja”. Acho até pecado chamar de sacrifício arrumar a cozinha. Então, eu canto muito aquela música assim: “Hoje é tempo de louvar a Deus, em nós agora habita seu Espírito, então é só cantar e a Cristo exaltar e sua glória encherá este lugar, Glória a Deus, Glóoooria a Deeeeuus” ... Ou então simplesmente canto: “Cordeiro de Deus ...” Procuro imitar a voz belíssima de minha mãe ao cantar, sem êxito, evidentemente, mas canto.
Voltemos ao que eu disse sobre “qualquer mínimo sacrifício”. São as pequenas coisas, como dizia Santa Teresinha. Não são as grandes coisas e grandes atos que nos salvarão ou que nos farão felizes. São as pequenas, tão pequenas que ninguém nota e isso agrada a Deus.
Olhando por outro viés, temos que admitir que são as pequenas coisas que tanto destroem um casamento como o salvam. Não precisa ser uma traição, que para mim é coisa grave, mas os pequenos maus humores e maus odores. As coisas graves geralmente são mais facilmente perdoadas, já as pequenas vão se acumulando sorrateiramente e minando o relacionamento. Aquela mania que vai irritando, aquela cadeira sempre fora do lugar, a famosa pasta de dentes aberta. Por outro lado, as pequenas coisas também podem ser preciosas para o casamento. Quando eu disse, “bem, não vou mais ficar aqui depois do almoço conversando até você dormir porque a cozinha me espera”, ele me disse: “fica mais um tantinho porque são essas pequenas e pouquinhas coisas que fazem o amor.” Fiquei. Como não?
E por fim, não nos esqueçamos: os melhores perfumes vêm nos pequenos frascos.          

domingo, 9 de fevereiro de 2020

O IMPOSSÍVEL PODE SER POSSÍVEL



Acho que nunca vou me esquecer de uma frase de Nelson Mandela: “Todas as coisas são impossíveis até que sejam feitas”. Verdade verdadeiríssima! Já li também numa clínica uma frase mais ou menos assim: “Ele não sabia que era impossível, então foi e fez”. Quando nos é passada uma mensagem que tal coisa é impossível ou que nós não conseguiremos fazê-la, nossa mente aceita, assimila e pronto, não vamos fazer, sequer tentaremos. É o tal caso do besouro que li num livro do Guimarães Rosa. O besouro não poderia voar. Sua compleição, medidas, forma e peso do corpo não lhe permitem voar, mas ele voa e alto, alto até a luz do poste, pelo menos. Mas eu vos pergunto: o besouro sabe que não pode voar? Não. Se ele soubesse, talvez não voasse.
   Pois é, transpondo para nossa condição humana, verificamos que somos capazes de proezas incríveis, vencemos obstáculos intransponíveis, porém apenas quando nos vemos em uma situação limite. Normalmente guardamos nossas ousadias e preferimos ações mais comedidas. E nossa vida acaba sendo uma monótona sucessão de ações comuns. O foco todo parece estar centrado não naquilo que podemos ou não, mas no que ACREDITAMOS que podemos. Não está no poder, está no crer. O besouro não pode voar, mas não sabe disso, acredita que pode e voa. A águia pode voar, mas se criada entre galinhas, acredita que não pode e não voa.
Em um documentário de televisão já foi mostrado que pessoas que nasceram com deficiência no cérebro, contra todas as evidências científicas, desenvolveram aptidões normalmente tidas como impossíveis. O cérebro, vamos dizer assim, molda-se à situação exigida. A força da mente é demais! Diga a uma pessoa do que ela é capaz e observe. De outra maneira, diga do que não é e também observe.
Gosto muito de um livro que sempre trago comigo: “Não apresse o rio, ele corre sozinho”. A autora, Barry Stevens, relata em determinado ponto que nunca acreditou no diagnóstico dos médicos que alegava que ela sofria de lesão permanente no sistema nervoso central. Afirmava ela: “Lesão, sim. Permanente, não. Que se danem aqueles médicos que há catorze anos me disseram para aceitar minha condição tal como ela era porque jamais eu iria melhorar.” E porque ela acreditou que a lesão não era permanente, ela pôde desfrutar de uma vida saudável, o suficiente para trabalhar e se encantar com o mundo, com a dádiva da vida, com o tesouro do conhecimento, com a beleza da natureza, com tudo.
Então, chamem do que quiserem, fé, obstinação, força da mente, o fato é que acreditar faz toda a diferença. Perdi muito tempo em minha vida, achando que eu não era capaz de muita coisa. Porém, um dia, uma pessoa muito intuitiva se referiu a mim como “aquele furacão”. Aquela frase dita num determinado momento, num determinado lugar e com tal determinação caiu como um raio em mim. Eu era um furacão e nunca tinha percebido. Daí por diante assumi a força do furacão. É muito comum que uma criança ou jovem sejam destruídos por rejeições, por frases negativas ditas por alguém cruel e essas palavras más soam como decretos, como maldição que acompanham a gente pela vida afora.  
Não deixem que as palavras más determinem sua vida, não aceitem os rótulos, desafiem os diagnósticos mesmo aqueles cientificamente comprovados, aceitem a fé, a força da mente, a força do desejo porque somos bem maiores e melhores do que supomos e quando descobrimos que dentro de nós existem dons e talentos adormecidos, ah é uma delícia acordá-los. São tesouros, presentes de Deus. Sim, você pode! Nós podemos!     

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2020

CRESCEI E MULTIPLICAI-VOS




Minha mãe teve seis filhos. Na época não existiam métodos contraceptivos modernos, mas mesmo que houvessem, ela jamais teria feito uso. Teve quantos filhos Deus mandou, como se costuma dizer. Assim viemos do jeito mais natural que havia e que há. Eu, como cristã católica, digo, parodiando minha saudosa amiga Sandra, que Deus se agradou da decisão de meus pais e enviou quantos filhos Ele queria.
Aliás, quando eu era menina e ainda nada sabia sobre sexo, eu julgava que as barrigas das mães cresciam espontaneamente assim que se casavam e que Deus é quem mandava esses filhos. O que me intrigava era por que para uns ele mandava seis, para outros, dez, doze, como se usava na época e para outros ainda, até um único filho. O critério de Deus era um mistério para mim. Ainda é. Deus é Deus e pronto. Um dia saberemos.
Por que falo sobre isso hoje? Porque há poucos dias vinha eu andando para casa quando vi uma cena que me comoveu. Nos modernos tempos de hoje quando o casal se limita a ter no máximo do máximo um filho apenas, eu vejo um jovem rapaz com um bebezinho no colo, já sentadinho, também puxava pela mão um garotinho bem pequeno e mais à frente um garoto maiorzinho. Três filhinhos! Que beleza, que beleza! Como diria minha mãe. A mulher provavelmente estaria em casa, fazendo uma faxina ou no salão fazendo o cabelo e descansando da lida diária. Era sábado.
Eu sei, eu sei que o mundo é outro, eu sei que as mulheres deixaram de ser donas de casa, que o orçamento pequeno exige que trabalhem fora e é bom que o façam, aquelas que assim gostem e queiram. Eu sei que babás e creches são caras, eu sei que tudo ficou mais caro e mais complicado de criar filhos neste mundo maluco, eu sei que a população do planeta já ultrapassou seus 7,7 bilhões. Sei de tudo isso, mas que é bonito ver três filhinhos, isso é. O rapaz não era rico não, nem rico, nem pobre, simples. Fiquei imaginando se fariam como lá em casa em que uma roupa era passada para o outro mais novo até o último. 
Bem, e ontem, exatamente ontem, encontrei com minha prima que me apresentou a uma mulher simpática, talvez mais nova do que eu. E ela contou que seu filho e sua nora optaram por ter quantos filhos Deus quisesse mandar. E eles têm sete filhos. Quando precisavam de pausa entre um filho e outro, lançavam mão da abstinência periódica. Sem sexo mesmo. Dois dos filhos já são quase monges. Deus caprichou, aproveitou e puxou a sardinha para seu lado. Que coisa mais bonita. Que beleza! Coisa rara.
Sei de todos os motivos para se ter apenas no máximo um filho. Há casais que até optam por cãezinhos e gatinhos. Bem, isso é outra história. Jamais vou dizer que é fácil criar filhos, há que se ter muita coragem. Contudo, sei também que Deus é fiel e abençoa. Falando em Deus, já contei isso em outra crônica, minha mãe teve cinco filhos seguidinhos. Já com mais de quarenta anos, quatro anos depois do último filho, ela percebeu que estava grávida. Ficou surpresa e feliz e aproveitou para pedir a Deus:
- Deus, já que o Senhor enviou mais um, gostaria que fosse menina, saudades de ter menina! Mas não quero mais loirinhas de olhinhos azuis. Não. Quero uma menina moreninha de olhos castanhos. Se puder, bem, se não puder, amém! E veio a Raquel, do jeitinho que minha mãe pediu. Que beleza! Que beleza!
   

O FIM DE UMA INFÂNCIA FELIZ



Assisti ao fim da 3ª e penso que última temporada do seriado “Anne with an E”. Chorei todas as lágrimas que tinha direito. Confesso que não gostei da 2ª temporada, mas amei a 1ª e fiquei literalmente encantada com a 3ª. Minha amiga Ju Campos Pereira por quem tenho uma terna afeição costumava me chamar de Anne porque dizia a Ju que eu era a própria Anne, plena de alegria com a vida e derramando esta vida em meus escritos. Ela também havia gostado imensamente da 1ª temporada e como a conheço penso que também, como eu, não gostou da 2ª. Mas Ju, se você não viu a 3ª, é linda! É a sensibilidade em seu grau máximo. E isto sem contar que a Marilla, a mãe adotiva da Anne é uma atriz idêntica à minha avó Verônica, cuspida e escarrada, como dizia minha mãe. Fisicamente e bondosamente a Marilla era minha avó que perdi tão cedo.
Bem, mas não é sobre o seriado que vou falar, não. É e não é. A Anne era assim efervescente, falava com as árvores, com os animais, com a lua. Era também dramática e eu sorrio agora enquanto digito porque eu me lembro de quando minha mãe dizia sempre: “A Maria Luiza é tão dramática!”, demorando enfaticamente na segunda sílaba: dramááááática! Eu era e sou. Também falo sozinha, com gatinhos, com Deus e com a lua. Com as árvores falei muito quando criança lá no alto dos últimos galhos.
Tive uma infância maravilhosa! O que uma criança poderia desejar para ser feliz vivendo em uma cidadezinha encantadora nos anos 50 e 60? Éramos livres, brincávamos na rua com pés descalços e o jardim da cidade ficava em frente a minha casa. E tudo isto com a vista magnífica daquelas montanhas! No quintal eu possuía toda a riqueza de que precisava. Havia mangueiras, laranjeiras, abacateiros, o cercado de tela com os cachorros perdigueiros. Muitos anos depois eu voltei naquela casa e caminhei por todos os cômodos como se andasse pelas estradas do passado. A dona da casa me levou até um muro onde havia meu nome incrustado na massa de cimento.   
Moramos ali até os meus doze anos. Depois minha infância foi assassinada. Tivemos que mudar para cá e eu simplesmente não aceitava. Minha mãe estava exultante porque sempre quis se mudar para a cidade onde morava sua mãe. Se alguém me perguntar qual foi o dia mais triste da minha vida, eu continuo respondendo que foi o dia da mudança. Aquela cidade era meu reino encantado! Lá tive meu primeiro amor platônico, não correspondido, é claro, mas não importava, “eu o amava” na efervescência dos meus doze anos. Eu chorei inconformada por muitos meses. Não era possível que uma vida de menina tão preciosa e tão plena pudesse estar contida na carroceria de um caminhão velho! Minha infância fugia de mim. Lembro-me de uma frase de Santo Agostinho que li: “Da infância, caminhando para o ponto onde estou, passei à meninice, ou melhor, ela chegou a mim em seguimento à infância, esta não se afastou: para onde poderia ir? No entanto, não mais existia.”
Fiquei doente várias vezes naquele ano, tive herpes na boca, foi uma ferida imensa que me obrigou a ficar em casa. Minha mãe, pobre mãe, teve que me levar ao médico também por causa de algo que eu sentia que andava por dentro de mim. E eu dizia para o médico: agora está andando aqui dentro da minha perna. Tudo isso de tristeza.
Antes ainda que nossa mudança fosse concretizada, meu pai já estava trabalhando aqui e minha irmã e eu também já estudando e morando com minha avó. Mas aos finais de semana voltávamos para “meu reino encantado”. Ainda não tinha caído a ficha para mim, afinal ainda tínhamos a casa lá. Mas às segundas eu tinha que voltar com meu pai. Na hora de despedir da mamãe eu fechava a cara, já morrendo de vontade de chorar. Ela virava as costas, aborrecida, e eu vinha de ônibus com meu pai. Eu não queria, mas não podia impedir que as lágrimas brotassem e escorressem pelo meu rosto. Meu pai fingia que não via porque nunca saberia lidar com aquela situação. Eu parecia uma fábrica de lágrimas. Silencioso, meu pai pigarreava a todo instante e eu passava a mão pelo rosto molhado, odiando a vida. Pobre pai! Só agora, com a modernidade em que as doenças ganharam nomes, sabemos que ele era um autista.
Só sarei muitos anos mais tarde. Dos meus doze aos vinte anos não há uma única foto em que eu esteja sorrindo e parodiando Mário Quintana, eu digo: “Nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão.” 
Mas eis que a “Anne with an E”  retornou mais tarde, mais forte, mais cheia de vida, borbulhando alegria, apaixonada pelo entardecer, admirada com a lua, porém sempre com as lágrimas que nunca pediram licença para brotar e escorrer pelo rosto. As cicatrizes, bem, estas ficam para nos lembrar que o luto é real.  

VESTIDO BRANCO DE LESE



Há poucos dias comprei um vestido branco. Ponto. Pronto, comprei. Não foi porque o réveillon vem aí. Nunca fui dessas coisas de vestir branco em réveillon, nada disso. O que quero dizer é que, de fato, passo a meia noite de qualquer ano dormindo. Se não dormindo, assistindo a algum filme, interessada para ver no vai dar a próxima cena. Não ligo para fogos. Gosto mais das estrelas cintilando quietinhas lá em cima. Há anos que não assisto à queima de fogos, nem ao vivo, nem pela televisão.
Mas o vestido branco e de lese! Ai! Ai! Estava lindo, estendido na loja por cima de um balcão. Me chamou atenção. Ah meu Deus, quanta vaidade, como sou vã, fútil e muita coisa mais. E logo agora que saí de casa imbuída do firme propósito de não comprar mais nada, a não ser o estritamente necessário. Mas aquele vestido era essencial sim senhor pra mim naquele momento. Depois de visto e vestido, impossível não comprar.
Não sou de fazer balanços do ano velho e nem tenho receitas para o ano novo. Fiz o melhor que pude e sempre tenho as melhores intenções. Só que as coisas acontecem, fogem de nosso controle e talvez o segredo da vida seja mesmo deixar os acontecimentos acontecerem. Dia primeiro de qualquer ano é igual a qualquer dia de qualquer outro ano. Sem dúvida alguma. Então, sem expectativas, embora expectativas sejam inevitáveis. E sofrimentos também. É deixar rolar.
Não existe esta de fazer este forrobodó todo só por causa do último dia do ano e do primeiro dia do próximo ano. A vida segue. Faço apenas uma reflexão que serve para qualquer dia de qualquer ano:
Por mais insignificante que tenha sido o dia findo ou por mais sofrido ou por mais gostoso, nenhum dia não voltará nunca mais. Adeus. Adeus. O dia de hoje se torna magistral pelo fato de ser um dia dos outros tantos que compõem nossa vida. O dia de hoje em que digito estas palavras é um dia único, um dia de ouro, é um dia de minha vida que ofereci a Deus pela manhã, ignorando obviamente o que vou viver hoje. Você pode escolher, esperar pelo pior ou pelo melhor. Eu prefiro seguir sempre acreditando que uma coisa maravilhosa está para acontecer neste dia, a qualquer momento. E às vezes é dia um terrível, daqueles que a gente, se pudesse, riscava do calendário. Mas mesmo assim, continua sendo um dia único que não voltará.
E depois dessa descoberta inédita e assombrosa que fiz de que cada dia é um dia único, torno ao assunto: odeio balanços e receitas, mas vá lá: o que ficou pra trás ficou, recomeçar sempre como uma criança, fazer de tudo para não faltar com a verdade, fazer o que é certo custe o que custar. Pedir simplicidade a Deus, gostar de coisas simples como um café quente com pão, de olhar o céu ficando noite de tardinha e de uns brinquinhos, um vestidinho branco de lese, ora bolas, afinal a gente é mulher. Não é nenhum vestido desses de OSCAR, mas sinceramente? Eu me senti uma Helen Mirren!
Adeus querido Ano Velho, seja bem-vindo querido Ano Novo!