Pelos
meus doze anos eu sabia que mudaríamos de cidade, mas não entendi muito bem, afinal
aquilo era assunto para os adultos que decidiam nossa vida e assim é e deve ser
quando somos crianças. No meu parco entendimento de menina nós continuaríamos
com nossa casa em Pedralva. Estarrecida percebi quando voltava da casa de minha
avó aqui em Itajubá que outras pessoas já moravam na minha casa, ocupavam meu
quarto, subiam a escada de madeira que conduzia ao piso superior, avistavam aquelas
esplendorosas montanhas que eu feliz contemplava da janela do quarto de costura,
transitavam por meu quintal, subiam em
meus abacateiros, laranjeiras e outras árvores, minhas eternas amigas de
infância.
Naquela
época, eu, menina ingênua e sonhadora, com uma bagagem de poemas que só nasceriam
num futuro distante, então, eu não sabia que aquela cidade e aquelas
assombrosas montanhas não seriam mais minhas. Nos meus doze anos, ainda
permanecia nos oito, como também mais tarde, nos vinte anos, eu não passava de
treze ou quatorze, como sempre, até hoje, nunca tenho a idade que tenho. Tudo
ficou parado, atrasado e congelado. Contudo, com algum esforço, ainda trago a
menina que derramou copiosamente lágrimas de dor e amargura. Há perdas muito
maiores, há tragédias devastadoras, mas naquele momento minha tragédia era meu
abandono. Eu não entendia a dor, nem a razão. Meus irmãos exultavam com a
aventura da mudança, pulavam de alegria na carroceria do caminhão, e eu
soluçava como solucei por dias, semanas e meses. Eu não era como eles. Eu era
diferente e não sabia. Ficaram as cicatrizes. Deixamos o passado para trás, mas
o passado não nos deixa.
Como
Fernando Pessoa, eu digo que “o que eu sou hoje é terem vendido a casa. É terem
morrido todos. É estar eu sobrevivente a mim mesma como um fósforo frio.” Sim,
sobrevivi como que agarrando um pedaço de madeira num oceano bravio. Lutei para
chegar a alguma terra e viver! Sobrevivi, porém, tive que arrastar sempre
comigo os fantasmas de um passado e as lágrimas que de repente brotam em meus
olhos, sem que eu possa impedi-las. Sim, o vale de lágrimas existe e mora em alguma
fonte do coração que também por bem abriga o amor. Quando as lágrimas
transbordam trazem com elas o amor que se derrama prodigamente pelo meu rosto e
pela minha vida. E eu sorrio como estou sorrindo agora no momento em que digito
essas palavras. Sorrio, como nunca deixei de sorrir, felizmente!