segunda-feira, 1 de abril de 2019

AVÓ



Da avó paterna, assisti apenas à morte, eu ainda tão pequena.
Da materna, um tanto de vida.
Por exemplo, trazia seus quintais sempre floridos
Em cada casa alugada que morou.
Fazia um franguinho ensopado maravilhoso,
Bife com caldinho e cebolas
E ainda bolachinhas de nata.
Era amorosa, mas sem rompantes, sem muita festa.
Às vezes vou rezar sentada em minha cama
Com meus livros de oração e me lembro dela
Assim nessa mesma posição.
Do começo do corredor eu já a avistava
Com aquele seu perfil de baronesa
Os cabelos grisalhos puxados para trás
E presos com dois pentinhos
Os óculos de aros fininhos na ponta do nariz
Numa quietude de santos.
De quando em quando interrompia a leitura
Para coçar a ferida na perna.
O livro aberto no colo seria a Liturgia das Horas?
Não sei. Sei que hoje aqui eu faço a mesma coisa.
Sorrio agora enquanto digito este texto poético ou não.
Peço emprestada à infância sua imagem e
É só fechar os olhos e a vejo perfeitamente
Lendo suas orações com o livro no colo.
Naqueles primitivos tempos
Quando me trazia de ônibus, ela perguntava:
- Você prefere ir pra casa de charrete ou de táxi?
E eu, sempre doida pra andar de carro, respondia:
- Táxi.
E ela, esperta:
- De charrete o passeio demora mais.
Eu não pestanejava:
- De charrete.
Sorrio novamente.
Lembro-me de menina ainda entrar por sua casa
Quando ela veio ao meu encontro sorrindo
Minha avó me amava
O amor sobejava.

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