A menina olhou disfarçadamente
através das cortinas do palco. A plateia começava a crescer. Sentiu um frio
percorrer todo seu corpo. Tudo parecia mais fácil enquanto as cadeiras estavam
vazias. Agora ela teria que declamar o poema de dia das mães para vários pares
de olhos, e assim tudo ficava mais difícil. Pela primeira vez sentiu o peso da
própria imagem, o peso dos outros. Desejou não ter aceitado a tarefa, e agora
poderia estar com sua mãe lá nas cadeiras assistindo aos seus colegas. Era
tarde demais. Lá vinha a professora loira, gorda e alta. Chamou a atenção da
menina para que saísse de trás das cortinas. A menina foi para a varanda que
havia atrás do palco. Lá ficou rememorando o poema, frase por frase, palavra
por palavra. Depois se lembrou de que não fizera gestos e começou tudo de novo.
De repente olhou para o céu estrelado e tudo o que quis era refugiar-se em uma
estrela. Lá na rua de trás brincavam dois meninos distraidamente com a vida e a
menina invejou a liberdade deles. Voltou-se para sua prisão, seu poema de dia
das mães. Se ao menos o teatro estivesse vazio...
A professora apareceu, toda imensa e
loira. Seu cabelo liso e macio caía maravilhoso sobre o rosto, e ela percebeu a
angústia da menina. Abaixou-se e lhe disse palavras de confiança. A menina
acatou a generosidade da professora, mas sabia que nada nem ninguém poderia
salvá-la naquele momento. Era como uma batalha, e como um bom soldado, esperava
resignada a ordem de ataque. Olhou novamente para a noite fria que apenas
cumpria seu papel com serenidade e jurou que na noite seguinte ela brincaria
como os meninos e seria livre como eles. Enfim chegou o momento. A professora
viera lhe buscar, e com gentileza encorajou-a a se apresentar. Alguém anunciava
seu nome e dizia o nome do poema: Mãe. A menina viu-se sozinha no palco e no mundo.
À sua frente milhares de caras e olhos esperavam que ela declamasse seu poema.
Ela achou o rosto da mãe e começou a dizer os versos e a fazer os gestos, a
princípio com moderação, depois com mais entusiasmo, depois ainda com pujança
de ares teatrais. O poema não durou mais do que cinco minutos, talvez bem
menos. Chuvas de aplausos caíram e ela percebeu que seu martírio terminara.
Agradeceu com graciosidade e voltou-se para dentro da cortina, onde a
professora a esperava com os braços abertos.
Mãe
e filha voltaram felizes para casa. Nunca fora tão difícil e tão fácil. E a
vida igualmente nunca fora mais bela.
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