sábado, 13 de maio de 2017

O QUE DIRIA MINHA MÃE (se pudesse responder minha crônica)



Logo após a morte de minha mãe fiz uma crônica para elaborar meu luto. Neste Dia das Mães, que também seria seu aniversário (dois dias depois do meu!), quis homenageá-la de maneira diferente. Imaginei como seria uma carta dela hoje para mim. Isso porque na crônica inicial, eu, dolorida e inconformada, perguntava por ela: Onde está minha mãe?
            Certamente ela diria: ora que bobagem, gente! (ela era prática, objetiva! Usava demais esta frase). Chega de chororô. Vocês agem como se fôssemos viver para sempre todos juntos! Viveremos eternamente, mas não na vida terrena. Aí fazemos um ensaio, apenas um ensaio. Aqui é a VIDA.
Não há palavras que descrevam o Céu! A textura, as cores e tons! Tudo está muito além do olhar humano e de qualquer explicação. A alegria é tão perene e forte como a que as crianças bem pequenas sentem quando os pais as cobrem de carinho e proteção. A luz do Céu é intensa, ela nos envolve com um fulgor igualmente impossível de ser descrito. Entre as pessoas que me esperavam logo vi o papai. Ele vinha em minha direção com uma felicidade plena, e vinha louvando a Deus. Não usava mais aqueles óculos de lentes grossas, e seus olhos brilhavam. Era o mesmo, tal qual eu me lembrava já adulta, porém sua juventude estava presente mesmo apesar da idade! Ele sorria muito, abriu os braços e me apertou num abraço de quebrar as costelas, como costumávamos dizer aí. Aqui somos invadidos por uma alegria de tal forma que não sentimos necessidade de questionamentos e explicações. Tudo é paz e tudo é perfeito.
            Comentando seus dizeres no texto, eu digo que sim, eu era uma mulher bonita! Obrigada! Rsss. (ela nunca soube receber elogios!). Diziam que eu me parecia com a Ingrid Bergman, só que você, Maria Luiza, sempre foi exagerada (escritores e poetas são mesmo!). A melhor costureira de camisas de homem? Nem tanto, mas eu costurava bem, ah isso sim.
            É mesmo, eu me lembro que sempre falava isso: se eu não tiver nada para apresentar a Deus na minha última hora, pelo menos apresentarei o peso das sacolas que eu trago do mercado para sustentar minha família. Sim, é verdade. Mas Deus me apresentou tantas outras coisas que também fiz. Fiquei surpresa. Ele me fez enxergar tanto mais do que eu enxergava na minha pobre visão terrena.
Minha querida menina! (Isso ela nunca disse, tinha um medo danado de estragar os filhos!). Então você se lembra da toalha da princesa! Pois eu me lembro de quando você rodeava a mesa seguindo o bordado! Nossa! Como a vida passa rápido! E como a vida é frágil! Pois já é tempo de você aprender que as princesas também envelhecem e morrem! Depende de como encaramos a velhice e a morte. Eu nunca me importei nem com uma nem outra (é a pura verdade!).
Recebi as rugas como coisa natural da vida! E também recebi a morte como fato natural. Fiquei ansiosa porque caminhava sozinha, a princípio. O barqueiro não era impiedoso como você diz em seu texto, e em seu barco havia muitas pessoas, tantas quanto são as moradas do Céu e como são os caminhos que nos levam lá. A morte é necessária até para nos fazer todos irmãos, li isso certa vez. É o nosso grande encontro com o Pai. É a volta para Casa. É viver na glória eterna.
Manuel Bandeira tinha razão em parte: “a vida assim nos afeiçoa, prende. Antes fosse toda fel! Que ao  mostrar às vezes boa, ela requinta em ser cruel”. Mas entenda que enquanto estamos nessa vida terrena tudo dói! O medo, as doenças, o desencanto com as expectativas que não foram realizadas. A vida prende, criamos laços, contudo não queira ver a vida como sendo toda fel, não é. Às vezes é boa, às vezes é cruel. Mas ainda é o que você tem no momento. Viva bem, seja feliz, e sofra bem se tiver que ser assim e quase sempre é. Houve momentos tão bons, sorrisos, sonhos! Como fui feliz ao ter cada um de vocês em meus braços! O sofrimento faz parte! Confesso que ao final eu quase desisti de ser feliz, mas Deus estava ali comigo, eu é que não percebi.
 Não se preocupe com as coisas que ficaram por dizer, ora que bobagem, gente! Tudo está bem. Amamos, sonhamos, sofremos, vivemos. Enfrentamos tantas tempestades, nosso barco foi sacudido, as velas arrancadas, mas no fim tudo ficou bem.
Eu sei que a saudade é dolorosa. Eu estou do outro lado, você não vê. Não pode ainda. Mas a sua princesa está bem, está no palácio do Rei, onde um dia todos nós estaremos reunidos. Aqui somos engolfados gloriosamente por alegria e luz inimagináveis! Realmente não há tristeza e Deus já nos enxugou toda lágrima, pois Ele removeu de minha consciência qualquer medo ou preocupação, até a saudade.
Se você pudesse ouvir a música celestial dos anjos! Revestidos de luz fulgurante, eles não cantam músicas tristes, mas músicas lindas e santas de louvor a Deus, com melodias e tons que eu nunca tinha ouvido nem imaginado. Também a impressão que tenho é que cantam várias músicas ao mesmo tempo e todas combinam exatamente, sem que uma atrapalhe a outra. Não há palavras que explique, já disse isso. Por mais músicos geniais que Deus tenha nos presenteado em vida, nada há que se compare à música celestial.
Ah, quase me esqueço de contar: Nossa Senhora, a Bem aventurada Virgem Maria está presente em todos os lugares. Nosso encontro foi divino, glorioso! Eu disse, emocionada: “É a Senhora! O Senhor está contigo”, desde que aprendi em vida que estas são as palavras mais nobres que podemos dirigir à Nossa Senhora (Santo Tomás de Aquino). Ela sorriu e me agradeceu muito por todo o amor que sempre tive por ela em meus anos de vida. Finalmente juntas!
Creia-me, Maria Luiza (raramente ela me chamava de Misa), aqui não há tempo, não há tristeza, só amor e felicidade!
Faltou falar dos santos, ah os santos de Deus! Nem te conto!
O Céu é extraordinário! (seu adjetivo preferido!).

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