sábado, 10 de junho de 2017

ETERNO NAMORADO



“Quando eu sei que ele vem, eu fecho a porta para a grata surpresa. Vou abri-la como o fazem as noivas e as amantes. Seu nome é: Salvador do meu corpo.” (Adélia Prado)
Quando meu amor ainda não tinha chegado à minha vida, eu achava a maior antipatia quem chamava pelo namorado ou marido de bem, beiêeee! Para pagar a língua, só chamo meu bem de bem, beiêee vem cá, beiêee põe água nas plantas pra mim, bem pra cá, bem pra lá, afinal “amor, tem que falar meu bem”, diz Adélia Prado. Como não chamar de bem quem me advertiu com uma adorável e solene seriedade na véspera do casamento: casamento pra mim é pra toda a vida, viu? E eu sorrindo concordei feliz como são todas as noivas, embora soubesse que o futuro a Deus pertencia. Que me importava o futuro? O presente era tudo e continua sendo. O futuro não existe, não é assim que dizem?
Bem, agora este bem em início da frase não significa bem de amor, nem é substantivo, tampouco advérbio, talvez mais para interjeição. É algo como “vamos lá” ou talvez “vejamos”, sei lá, mania de continuar a conversa. Bem, e vamos vivendo o presente cheio de pequenas coisas grandiosas, como quando ouço seus passos na escada e chamo pelo seu nome, e ele me responde solícito. Ou quando conversamos na hora do almoço e falamos de filosofia, de gramática, de história, de filmes, de pratos a serem testados e até de alienígenas.
E ele sempre me conta histórias bobinhas para desmanchar minha cara feia. Como aquela em que eu não queria mais comer carne e ele, sério com um riso no canto da boca, me segreda que um boi seu amigo disse que neste mundo de Nosso Senhor um come o outro, por isso ele, o boi, está de acordo que a gente coma sua carne. E aquela em que os homens das cavernas pensavam que a mulher tinha poderes sobrenaturais,  pois podiam procriar e eles não. Aí um dia descobriram que sem seu sêmen os bebês  não seriam feitos e então fizeram o diabo a quatro, arrastaram suas mulheres pelos cabelos e deram início a milênios de dominação machista.  
Às vezes fico amuada, coisa de menina mimada. Ele acha graça e me diz que eu pareço a personagem da música de Juca Chaves, “de dia uma menina, de noite uma mulher”. 
No entanto, não desejo amores arrebatadores nem paixões avassaladoras ou corações tresloucados, amar baixinho já é loucura demais. Quero a presença calma, a gentileza dos momentos comuns de todos os dias, a empada de palmito, as empanadas, o pão caseiro, o chope amargo ou o vinho bem seco. Quero andar de mãos dadas, o sorriso certo, sempre a cama simples, mas quente, sem pudores. Quero o amante e o eterno namorado. Quero o presente porque o futuro a Deus pertence. Quero a presença.
Mas no dia dos namorados vou querer bolo de noiva sim senhor, camafeu e champanhe. O amor deve ser tudo isso. A gente é que nunca percebe.  

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