Confesso que sempre negligenciei os
exercícios físicos, volta e meia estou procurando desculpas para não me
exercitar. Fico eternamente recomeçando de tal forma que quando meu médico
pergunta: e aí, tá fazendo exercícios? Eu respondo, no momento sim. Reiniciei
pela enésima vez a musculação. Sei que é necessário, mas sigo para a academia cambaleante
e sofrida como uma condenada arrastando ferros para subir ao cadafalso. Quando
vai chegando a hora sou acometida por uma tristeza sem igual, além de um sono
irresistível que se pudesse deitaria e dormiria por horas o sono precioso que
me foge à noite. Mas tenho ido, não sei até quando. O fato de ir com alguém
ajuda bem. Minha irmã e eu vamos juntas, isso quando ela vai, pois mais não vai
do que vai.
Nosso personal trainer é um anjo, um
menino educadíssimo, encantador e competente que nos incentiva a todo instante:
Vamos Dona Misa, falta pouco! Muito bem Dona Misa! Desde a hora que chego lá
até a hora de sair padeço de um estranho transtorno obsessivo compulsivo: não
tiro os olhos do relógio contando os minutos para vir embora. Abro a boca,
bocejando como se não dormisse há séculos. Mas vamos lá, a gente não faz apenas
o que dá prazer, mas o que precisa fazer.
Por incrível que pareça, o exercício
que me atrai é aquela remada no verdadeiro sentido da palavra. Sinto-me um autêntico
Ben Hur nas galés, puxo os braços e empurro os pés. Fecho os olhos e me imagino
lá, eu e Charlton Heston com o suor escorrendo seguindo aquela batida ritmada.
Aliás, imaginar é minha especialidade. Olho em volta e vejo seres do outro
mundo: homens musculosos, moças de músculos durinhos que empurram pneus grossos
fazendo-os cair estrondosamente pelo chão. Esteiras a 120 por hora, música
maluca de fundo, e de repente lembro-me da Caverna de Platão ... “que estranhos
seres são estes?” e fico pensando se meus pais e avós pudessem visitar uma
academia de musculação, o que diriam? Certamente pensariam que estavam
transportados para outro planeta. Enfim, faço o tempo passar.
Outro dia o personal achou de
exercitar certo pequeno músculo chamado “manguito do rotador”, do qual nunca
ouvi falar mais gordo ou mais magro, fica mais ou menos dentro da escápula
(sabe-se lá o que é isso, acho que é o ombro). Bem, ele disse que é um músculo
pouco exercitado. Na aula seguinte, eu e minha irmã estávamos literalmente quebradas,
tudo doía, e cheguei à conclusão de que o moço estava certo. O tal músculo na
verdade nunca tinha sido exercitado, simplesmente jazia inconsciente entre as
fibras de minha escápula desde meu nascimento, e fora enfim acordado de seu
sono de mais sessenta anos. Pela primeira vez era incentivado a trabalhar e já o
imaginei se espreguiçando todo com mais preguiça do que meu corpo que o
abrigava comodamente.
Agora
o rapaz pegou a mania de nos manter enganchadas numa barra, soltando todo o
corpo para nos esticarmos. Fecho os olhos porque, aterrorizada, compreendo
finalmente a razão de as pessoas não conseguirem se manter penduradas em pontas
de telhado ou parapeitos de janelas. As pobres mãos não aguentam. Enquanto ele faz
a contagem: 1,2,3 ...20, eu fecho os olhos e vivo momentos de intenso terror
lembrando-me do filme “Um corpo que cai” do Hitchcock”.
Finalmente os ponteiros do relógio
sinalizam que a aula chegou ao fim. Sinto-me
ótima! Nada como o depois da
musculação. Tudo passa. Saio da loucademia, que alegria!
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