terça-feira, 28 de novembro de 2023

O CÉU TEVE QUE ESPERAR E MINHA MÃE TAMBÉM

 

 

 

Palavras de minha mãe no início dos anos 80:

"Eu me sentia exausta e muito fraca, e percebi que os médicos estavam muito preocupados. Quando me levaram para a sala de cirurgias, eu tinha certeza de que ia morrer. Mais tarde soube que eles também tinham essa certeza. Fiquei muito feliz, finalmente eu ia me encontrar com Deus. Então, fui cantando baixinho, um pouco porque estava tão fraca e cansada que não conseguia emitir nenhum som, e também porque não queria que ninguém ouvisse. Eu cantava uma música de louvor a Deus, emocionada com a minha morte. Mas aí, eu me lembrei dos meus filhos. Só a Agueda estava casada, os outros ainda não estavam encaminhados. Eu fiquei preocupada, achei que ainda não podia morrer, mas fui encomendando cada um deles a Deus, depois o Tote. E pensei que Deus resolveria tudo a seu modo, pois eu queria morrer para estar com Ele. No outro dia, acordei cheia de dores, abri os olhos e pensei - 'isto não pode ser o Céu!'"

(Isto se passou no início dos anos 80. Minha mãe foi se encontrar com Deus em 2010 - O céu teve que esperar e ela também!)

Depois de publicado qualquer um dos 7 livros que publiquei, raramente eu abria um deles para ler. Era algo como uma missão cumprida, acabada, passada. Achava estranho folhear o livro. Não sei ao certo, penso que temia encontrar um erro ou alguma coisa que não me convencesse de que fosse boa. Achava estranho que fosse eu quem tivesse escrito tal e tal coisa. Mas ultimamente tenho feito isso, folheio os livros ao acaso, um e outro, e tenho encontrado passagens líricas como o diálogo com minha avó. E também foi assim que nunca achei tão bonito como hoje este relato da minha mãe que transcrevi quando publiquei “Demência: o resgate da ternura”. De fato, a gente nunca é a mesma de anos atrás ou mesmo a de ontem, ou de horas. A cada momento alguma coisa que escrevemos ou lemos vai cair em cheio de forma diferente em nossas emoções, em nosso coração. O rio não é mais o mesmo e nós também não somos mais os mesmos.

 

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