O nome dele era
Solano. O sobrenome, nunca soube. Ele apareceu numa tarde de inverno, quebrando
a solitária mesmice daqueles dias.
Para
suportar melhor uma grande dor, fiz minha mudança para o campo e ali fiquei
completamente só. Quando a gente sofre muito, vai fechando muitas portas.
Então, dediquei-me a cultivar algumas verduras e flores. Pela manhã, sentava-me
nos canteiros e me punha a vigiar até que a florzinha desse algum sinal de
vida, exatamente como quando eu era menina. Sob o olhar amoroso de minha avó, eu
ficava atenta sobre a terra e bastava um segundo de distração para que a
plantinha resolvesse nascer, como que a enganar a gente.
Então,
como ia dizendo, apareceu aquele homem, um homenzinho atarracado e careca.
Tirou o chapéu, enxugou o suor da testa e sorriu. Disse que se chamava Solano e
perguntou se eu queria comprar florais. Florais, pensei. Não, não quero nada. O homenzinho não insistiu, pediu um pouco de
água. Enquanto bebia, ficou atraído por um quadro pendurado na varanda, que
mostrava a cidade de Delhi. Olhou, olhou sem pressa e me perguntou se eu já
havia estado na Índia. Eu respondi que não, o quadro me fora dado por uma prima
que lá estivera. Ele achegou-se mais como que fascinado e disse que em Delhi,
nunca cruzara com tanta gente e tão diferente de nossa gente, todos embrulhados
em seus panos, bonitos e feios, coloridos e encardidos. E citou uma frase de
Rabindranath Tagore: “cruzo com uma centena de homens indo para Delhi: e cada
um deles é meu irmão”.
E foi assim que Solano foi embora,
assim, como quem traz uma mensagem. No dia seguinte fiz minha mala, fechei a
casa e voltei para a cidade. E nunca mais me esqueci: “cruzo com uma centena de
homens indo para Delhi: e cada um deles é meu irmão”. Assim disse aquele
estranho homenzinho chamado Solano, para que eu voltasse à vida.
Muito profundo...Gostei demais! - Sô Del-Ducca
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