Estava eu ontem, dia 4, assistindo à
missa na Matriz da Soledade quando ouvi a Primeira Leitura que tratava dos
144.000 assinalados. Impossível não me lembrar da Babá, mulher excepcionalmente
encantadora que tive a honra de conviver por longos anos. Ela e minha mãe eram
muito amigas, coisa de confidentes mesmo. Lembro-me de quando minha mãe ia até
sua casa e em seu quarto trocavam desabafos, mas 98% das conversas versavam
sobre orações, vidas dos santos, como devia ser o Céu e tal e tal. Eram tão
amigas e tão piedosas que quando se encontravam seu cumprimento não poderia ser
outro:
- Mamãe: E o anjo do
Senhor anunciou a Maria!
- Babá: E ela
concebeu do Espírito Santo.
- Mamãe: Eis aqui a
escrava do Senhor,
- Babá: Faça-se em
mim segundo à Vossa Palavra.
- Mamãe: E o Verbo
Divino encarnou,
- Babá: E habitou entre
de nós!
A Babá se chamava “Sebastiana Inês”,
mas “Babá” acabou por ser incorporado ao seu nome, ou seja, ela era sempre
chamada e conhecida pelo apelido de Babá por crianças e adultos. Menina ainda,
foi criada pelos avós de minha prima. Babá ajudou a criar ou criou mesmo a
primeira geração da família e depois a segunda. Era amada por todos. Lembro
agora do nosso saudoso Darci que adorava de paixão a Babá e ia muito à sua
casa. Em seus aniversários Babá recebia presentes de todos da família, como das
amigas da igreja, aliás, Babá não saía de lá. Enquanto pôde, ela subia o morro
da igreja para assistir à missa das 6 da manhã e, imagine, já ficava pra missa
das 7. Todo mundo já sabia.
Quando ficou mais velha e com mais
dificuldades para andar, minha mãe arrumava seu almoço e me pedia para levar lá
pra ela. Babá era extremamente carinhosa comigo. Via como eu me preocupava com
a mamãe e dizia, rindo: A filha é mãe da mãe, kkkkk.
Minha prima Musa foi encarregada de
recolher certa quantia dos irmãos e primos que ajudaram a Babá em sua velhice.
Musa comprava os medicamentos e levava para ela que lhe dizia: Oferece
mãezinha, oferece! (a Deus). Ela chamava a Musa de mãezinha! Quando a Musa
voltava do trabalho, quase sempre ia buscar a Babá para ficar com a tia Odete,
e depois a levava de carro para casa. No elevador, olhando a Musa pelo espelho,
a Babá dizia: Oferece, oferece, querendo dizer que “dava muito trabalho”.
Babá cometia apenas uma
“contravenção religiosa”: jogava no bicho. Alguém lhe dava algumas cartelas e
logo ela mandava uma das minhas primas com um dinheiro dobrado miudinho para
entregar a quem de direito. Se minhas primas não estivessem em casa, servia
qualquer um. Da janela ela chamava qualquer pessoa que morasse no bairro ali
pertinho onde ficava a lotérica do bicho. Seu Geraldo Charreteiro muitas vezes
parou sua charrete para a Babá que acenava para ele e assim também cumpria este
papel de entregador dos trocadinhos do jogo.
Não
sei se por causa deste “deslize” para mulher tão santa, ela se preocupava com o
portão do Céu. Seria aceita? É onde agora eu retomo o início deste relato. Em
Apoc. 7, 1-8, diz a palavra: “Não danifiqueis a terra, nem o mar, nem as
árvores, até que tenhamos assinalado os servos de nosso Deus em suas frontes”.
“Ouvi então o número de assinalados: cento e quarenta e quatro mil ...” E a Babá, preocupadíssima, perguntava
para minha mãe se ela estaria incluída nesses 144.000. Minha dizia que sim, que
“é lógico, minha filha, você está incluída, se não estiver, quem estará?” E
Babá foi para o Céu mansamente, numa santa morte, em 1996, deixando muitas
saudades. Sua lembrança para nós é tão doce que suponho ter ela deixado seu
coração conosco.
É
como ouvi de minha prima Alice Carvalho: a vida é tão rica, Deus é tão
bom!
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