Há poucos dias vi a postagem de uma
amiga no Face em que ela relatava, revoltada, uma cena de crueldade com
animais. Em nossa cidade, à rua Cesário Alvim um cavalo era duramente espancado
pelo seu condutor que exigia dele um esforço já acima de suas possibilidades.
Talvez o pobre animal se sentisse cansado demais pelo peso excessivo que
carregava, talvez estivesse trabalhando desde as primeiras horas do dia, com
sede e sem nenhum descanso. São inúmeras e repetidas cenas de crueldade que
temos assistido pela televisão como a de uma mulher que incitava o filho a
maltratar um cãozinho pisando nele e o jogando de encontro à parede. E por aí
vai. Essas cenas de barbárie não são raras e nos causam horror. É realmente
muito difícil entender o que se passa na cabeça e no coração de indivíduos como
esses que, ao que parece, devem sentir prazer ao torturar animais. Bem dizem
que quem é cruel com os animais, certamente é também cruel com as pessoas.
Mas essa questão não é simples, na
verdade é muito mais complexa do que imaginamos porque definir crueldade varia
de pessoa para pessoa. Há os que consideram o abate de gado para a produção de
carne tão cruel quanto maltratar um cão ou mesmo fazer experimentos científicos
que envolvem bichos. Afinal, não seria hipocrisia combater os maus tratos para com
os animais e se fartar com um bife suculento na refeição? Pois é. O que os
olhos não veem o coração não sente. Sempre me lembro do comentário de meu
marido que absorto, refletia enquanto esperávamos na fila do açougue: “pode
chegar o dia em que malvados alienígenas governem nosso planeta e então serão
nossas pernas e cabeças que poderão estar dependuradas nos seus açougues”.
Nunca mais comi um bife com o sabor de antigamente.
E se fôssemos nós os caçados, nós os
humilhados? Nós, os explorados e abatidos? Lembrei-me do filme “O planeta dos
macacos” que me impressionou muito na época e me fez refletir sobre o inverso
da situação A literatura nos dá outros exemplos fantásticos. O livro “A
revolução dos bichos” (1945), de George Orwell, um libertário com total aversão
a toda espécie de autoritarismo, figura entre os cem melhores da língua
inglesa. Embora o objetivo do autor fosse fazer uma sátira à União Soviética
comunista, o livro todo conta as peripécias dos animais de uma fazenda, que
incentivados por um velho porco, se rebelam e “tomam o poder”, concretizando o
sonho de serem governados por eles mesmos. Estabelecem daí por diante sete
mandamentos dos animais, entre eles, considerar “qualquer coisa que ande sobre
duas patas um inimigo e qualquer coisa que ande sobre quatro patas, ou tenha
asas, um amigo”. Mas a empreitada não tem sucesso porque de tanto conviver com
os homens eles aprendem a criar uma sociedade tão injusta quanto a dos humanos.
E eu não poderia deixar de citar o
memorável conto de Clarice Lispector, “Uma galinha”. A família decide matar a
galinha para o almoço do dia. A pobre ave que talvez trouxesse um anseio de
liberdade no peito, alça um voo curto e consegue fugir, pulando pelos telhados.
O dono da casa, impulsionado pelo seu anseio de conquista, galgando um muro
aqui e outro ali, logrou trazer a galinha de volta. “Sozinha no mundo, sem pai
nem mãe”, rodeada por gente estranha, a galinha sofre, se aninha no meio da
cozinha e põe um ovo, decerto prematuro pelo susto. A menina da casa exclama:
“Mamãe, mamãe, não mate a galinha, ela pôs um ovo! Ela quer o nosso bem”. Todos
são tocados pelo acontecido, intuem algo de sobrenatural e decidem pela vida da
galinha, que daquele dia em diante passa a ser a rainha da casa. Até que um dia
ela não escapa, pois finalmente decidem transformá-la em refeição.
O dicionário nos diz que animal é “um ser vivo
organizado e dotado de sensibilidade”. Os animais são sensíveis e sofrem. Em
determinado momento do conto, Clarice Lispector diz: “Que é que havia nas suas
vísceras que fazia dela um ser? A galinha é um ser”. Assim também são os
cavalos, os bois, os touros, os cães, os gatos, os elefantes e todos os outros
animais que merecem nossos cuidados, nosso carinho e nosso respeito.
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