quarta-feira, 12 de outubro de 2022

ELUCUBRAÇÕES NO PROVADOR DA JOKA

 

Hoje estive na Joka procurando um presentinho para minha cunhada que faz aniversário no domingo, dia das eleições. Não encontrei nada que me aprouvesse, aí acabei escolhendo duas calcinhas para mim, belezinhas. Só isso que a senhora procura? Perguntou a gentil atendente. É só. Mas ao me dirigir para o caixa, voltei, sucumbindo àquele famigerado desejo de comprar. Você teria alguma camisa na promoção? Daquela marca carésima que nunca compro, a “Dudalina”? Ah temos sim, e lá foi a moça buscar. Eu fui direto nos tons pastel que sempre me atraem, embora me aconselhem tons mais fortes. Uma camisa azul clarinha e uma rosa clarinha. Um mimo! Algodão egípcio, uma textura dessas que parecem orvalho caindo do céu. Decido experimentar. E lá fui para o provador, vesti a azul. Fiquei encantada. Meu olhar ficou perdido e viajei no tempo, como sempre.

Tudo isso que escrevo aqui, falei para meu marido na hora do almoço. Ele escutou pacientemente, mas como conheço sua dose de paciência, tentei resumir. Bem, disse eu, lá no provador eu fui remetida ao passado, à Aruba, na primeira viagem que fiz com a Sandra. Na semana da viagem chegaram nossos cartões de crédito, quase que os primeiros da agência. Em Aruba, tudo maravilhoso! De manhã no hotel, com as diversas piscinas rodeadas de árvores e plantas ornamentais, amostra dos primeiros resorts daquela época. Lembro-me até de que numa manhã na piscina surgiu um lagarto imenso, coloridíssimo como se tivesse sido pintado, uma beleza de bicho que foi perseguido pelas máquinas fotográficas dos americanos. Pela tarde íamos para o centro de compras, ah que maravilha! A rua dos perfumes, dos quimonos japoneses tipo peignoir, pulseiras indianas e outras lindezas. Para maior liberdade, nós nos separávamos e marcávamos encontro mais tarde numa cafeteria, onde mostrávamos o que tínhamos comprado e tomávamos um delicioso café com creme e saboreávamos tortas mil.

Tive uma infância simples, modesta. Lembro-me de minha mãe que fazia nossos vestidos. Sapatos novos? Ah, uma vez por ano. Mas já alcançávamos os anos 80, e o bendito cartão de crédito virou nossa cabeça. Já tínhamos nosso emprego, nossa independência, e viajamos um tanto, gastamos, mas nada exorbitante porque ricas é que nunca fomos. Agora, para sermos curadas do consumismo, foi e é difícil. Já melhorei muuuito, mas de repente tenho uma recaída, meus olhos brilham com as vitrines e coisas bonitas. Tudo isso eu me lembrava e refletia no provador, lógico que tudo rapidamente como é o pensamento e são as lembranças. A vendedora me esperava lá fora.

Meu marido começou a ficar impaciente: afinal, comprou as camisas?

Calma! Duas camisas eram um exagero! Tá bom, então uma só, a azul ou a rosa? Não, nem uma. Lembrei-me da pobreza dos santos, da freira que ia se mudar de casa em sua Ordem e levava tudo o que ela possuía dentro de uma sacola de pano, o que fez meus olhos marejarem, lembrei-me das pessoas que economizam para pagar um exame particular porque não dá para esperar pelo SUS ou as muitas e muitas pessoas que têm que pagar um aluguel e o dinheiro nunca é suficiente. Lembrei-me do pessoal vendendo balas pelas esquinas, dos pobres de quem não podemos nem devemos desviar os olhos.

E depois vem aquela odiosa pergunta: eu preciso disso? Não, não preciso, na verdade precisar mesmo, preciso de muito pouco, mas tenho tanto! É que as camisas eram tão lindas! A beleza também faz falta! Lembrei-me de Santa Teresa, falando sobre a beleza da pobreza, aquela pobreza que é abraçada só por Deus! Não comprei, prometi para mim mesma: Misa, deixa para a semana que vem. Se ainda estiverem na loja, você compra só uma. Se não estiverem, paciência. Oferece.

De tudo, ficou o comentário engraçado de meu marido: só não entendi o que o lagarto teve a ver com as camisas! Não sei se voltarei à Joca para comprar, todavia, sei que “o justo cai sete vezes ao dia”!  Mas que a azulzinha ficou linda em mim, isso ficou sim!

 

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