A família era pobre, mas era feliz
porque a felicidade não é ter uma vida absolutamente sem problemas, nem estar
constantemente cheio de dinheiro, sucesso, com filhos perfeitos, carros do ano,
enfim, felicidade não é o que infelizmente hoje em dia se luta bravamente para
conquistar por aí. Saúde por exemplo, é um bem precioso, só que muitas vezes
ocorre que nós, ou alguém nosso fica doente e aí passamos por aflições, mas a
felicidade está acima disso porque a vida é bela mesmo assim. Voltemos à
família em questão. Sim, era pobre, mas no inverno sempre havia o fogão à lenha
que trazia calor e mantinha sempre aquecido o chá de hortelã, antes de dormir.
No verão, havia o rio que fazia uma represa e as crianças e mesmo os adultos se
refrescavam naquela água cristalina. Havia os vizinhos também pobres, porém
todos se ajudavam, de tardezinha conversavam em cadeiras na calçada e assim
levava-se a vida sem muito peso. De vez em quando saía discussões, a mulher trazia
um dos filhos arrastado pela orelha, às vezes xingava as panelas que estavam
velhas, porém insisto, eles eram felizes.
E o Natal chegando. Os rapazes e também
os mais novos sabiam que o Natal era missa do galo e com muita sorte um
franguinho caipira no almoço do dia 25. Não havia presentes nem árvore de
Natal. E naquele ano um dos meninos mais novos cismou que queria uma árvore de
Natal. A mulher olhou para aquele desejo com certa apreensão. Árvore não era
problema porque o irmão mais velho apareceu com um pinheirinho apanhado lá no alto
da campina. Logo alguém surgiu trazendo uma lata com areia e o pinheiro ficou
lá verdinho e pelado num canto da sala. O menino reclamou que para ser árvore
de Natal era preciso pendurar bolas coloridas nos galhos. Não havia bolas
coloridas nem em preto e branco, contudo alguém se lembrou de que as árvores de
Natal também normalmente tinham neve, e o algodão foi logo providenciado, o que
já deixou o pinheirinho com um pálido esboço de árvore de Natal americana, e pôs
o menino mais animado.
Uma semana antes do Natal, a mulher
soube que na casa dos Custódio estavam dormindo no colchão de palha pura, sem
lençol, que um dos garotos estava doente e que mal tinham o que comer. Então
ela deu uma boa vasculhada em seus lençóis velhos, escolheu umas roupas dos
meninos, cerziu umas já esgarçadas, lavou, passou. Que fique claro que ela não
deu do que sobrava, mas do que ainda usava. E quando o filho mais velho que já
trabalhava na canjiqueira apareceu com o dinheiro da semana, ela gastou uma
parte no armazém para comprar mantimentos, e de noitinha fez uma visita aos
Custódio e deixou com eles o que podia. Foi uma festa para aquela família. Logo,
outros vizinhos também deram alguma coisa que foi possível. Quando a mulher
voltou, foi repreendida pelo marido que reclamou que mal tinham para eles e ela
havia gastado um dinheiro que faria falta. A mulher respondeu que sempre se
dava um jeito.
Na véspera do Natal, alguém veio
avisar que havia na estação de trem alguns sacos endereçados à família. A
mulher mandou dois dos filhos irem ver do que se tratava, talvez fosse um
engano, não haviam comprado nada, encomendado nada, não esperavam por nada. Dia
24 de dezembro, chegam os dois moços à casa com três sacos que fariam inveja ao
Papai Noel. Havia uma carta. Era de um primo melhor de vida que há muito tempo
morava na capital e que andava sumido. Pedia desculpas por não mandar nada
novo, embora algumas coisas tivessem sido pouco usadas e talvez pudessem servir
para os meninos. Rasgaram os sacos e toda a família não podia acreditar: roupas
de cama, toalhas de banho e de mesa, roupas de homem, de crianças, vestidos,
sapatos, até brinquedos, tudo praticamente novo. E também havia uma caixa muito
bem embrulhada, envolta em palha e algodão, cuidadosamente lacrada. Quando abriram,
a surpresa foi ainda maior – bolas de Natal, de todas as cores, até douradas e
prateadas. Duas ou três haviam quebrado, mas as outras que eram muitas vestiram
o pinheirinho de Natal no melhor estilo natalino, e o menino mais novo passava
os dias e as noites de olhos arregalados para sua Árvore de Natal. Aquele Natal
nunca foi esquecido.
Esta história é real, bem, quem
conta um conto aumenta um ponto. Digamos que foi inspirada em fatos reais, um
pouco ou muito exagerados por mim. É uma história de minha gente, gerações
passadas que trataram de registrar o fato para que os que viessem depois
ficassem sabendo.
Sabemos que só há uma maneira de
receber, é dando, e isto é uma lei que funciona tanto para o bem como para o
mal. Tudo retorna para nós. Em uma crônica de Cecília Meireles, ela diz: “ ...
e a felicidade não é pedir nem receber: a felicidade é dar. Pode-se dar um
flor, um pintinho, um caramujo, um peixe ...”
Os
melhores presentes nem sempre são os mais caros.
E as Festas estão chegando outra
vez. Feliz Natal!
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