Há anos atrás resolvi fazer
academia, ou seja, malhar para ficar bonitinha. Pois bem, a personal pegou
pesado comigo. Eu achando tudo uma beleza, fazendo proezas com pesos e encantada
com o atendimento especial só para mim. E fui fazendo isso e aquilo e até
“plataforma vibratória” achei de fazer, seguindo as orientações da moça. Meus
joelhos gritaram por socorro, claro né? eu já era “de idade”. Fui ao médico,
exames, e até hoje sofro com artrose severa. Bom, mas conversando com meu
médico, ele, muito engraçado, muito espirituoso, disse assim: vocês mulheres
têm cada coisa! Por que você não faz uma coisa normal, como caminhar ou hidroginástica
que é tão saudável? Por que essa inovação de plataforma vibratória? Tudo que
inventam vocês fazem sem pensar. Por que não observam a natureza e aprendem com
ela? Você já viu alguma vaca (ham?) fazendo plataforma vibratória? Não, não é?
A vaca está lá na dela com calma. Observe a natureza. E depois, a idade ...
E aí coincidiu que folheando um
livro, li algo sobre Arne Naess (1912-2009) que disse a seguinte frase: “Pense
como uma montanha”. Naess foi um filósofo e ecologista norueguês que propôs uma
experiência de “ecologia profunda.” Na verdade, essa noção de pensar como uma
montanha é do ecologista norte-americano Aldo Leopold. Ele havia trabalhado
como guarda florestal e certa vez atirou numa fêmea de lobo. Nunca mais pôde se
esquecer do brilho selvagem que morria nos olhos do animal e então ele percebeu
que havia naqueles olhos algo conhecido apenas pela loba e pela montanha onde
ela vivia. A proposta que Naess e Leopold fazem é que não reconheçamos somente
nossas necessidades, procurando apenas o benefício próprio e imediato, mas que
façamos parte da biosfera, não vendo o mundo como algo separado de nós, enfim,
devemos descobrir nosso lugar na natureza e perceber nossa responsabilidade
para com todos os outros seres vivos.
A preocupação com a preservação do
planeta como nossa casa já vem de longo tempo, talvez desde a Revolução
Industrial quando as primeiras nuvens de fumaças começaram a ganhar o céu.
Entretanto, são poucos os que realmente se preocupam com a questão. A tendência
é sempre pensar que o planeta é muito grande e que há exagero nos alarmes, ou
que outros mais preparados darão conta de batalhar sem nosso engajamento,
afinal o que podemos fazer é tão pouco que concretamente talvez não faça diferença.
Mas faz. Se cada habitante da Terra fizesse o que lhe é possível, muitas
batalhas já estariam ganhas. O problema são as empresas poderosas focadas no
lucro exorbitante e ignorando qualquer cuidado com o meio ambiente.
Essa consciência do “eu ecológico”
proposta por Arne Naess pode parecer estranha, embora todos sejam capazes de
adquiri-la, ampliando uma identificação com o mundo para incluir todo ser vivo.
É que há muito que aprender, pois uma coisa é respeitar os animais e árvores,
outra conviver com eles como irmãos, como fazia São Francisco. Sempre me lembro
de minha prima Lígia que morando no campo, costumava cumprimentar
carinhosamente uma galinha ou outra que por vezes entrava em sua casa. Ela não
tomava aquela atitude costumeira de enxotar a ave como todos fazem. Conversava
com ela como um ser semelhante, o que me divertia, pois achava um tanto
bizarro, ora, bizarro era eu já cinquentona torturando meus joelhos numa
plataforma vibratória. Também sempre me lembro de seu desconforto quando eu
demorava a fechar a torneira. Hoje percebo que minha prima há muito era uma
ecologista nata, seu pensamento e seu modo de sentir e viver o mundo era
autenticamente genuíno e elevado, pois ela verdadeiramente pensava e pensa como
uma montanha, quero dizer, ela se reconhecia como parte da natureza. Isso hoje
me comove tanto!
Arne Naess pregava uma harmonia com o
mundo natural, não apenas pela preocupação com a proteção do planeta visando
nosso conforto e proveito próprio, mas por uma questão mais elevada, por saber
que somos parte desse mundo e ao destruir nosso meio ambiente também destruímos
nossa própria vida. As mudanças nesse sentido têm ocorrido gradualmente, quero
dizer, o planeta corre perigo, sim, porque não são muitos os que já perceberam
o seu eu ecológico. Por outro lado, por necessidade ou realmente por uma
mudança de mentalidade, as pessoas vão adotando novos comportamentos, como é o
caso de muitos jovens que optam por não terem carro. A vaidade de se ter e
exibir um carrão vai ficando para os mais velhos, ainda fixados nessa obsessão.
A transformação para adquirir uma consciência ecológica profunda é lenta, mas temos
esperança num futuro melhor para que nossos netos e bisnetos possam viver de
modo diferente, levando uma vida mais prazerosa em sintonia com a natureza.
Pensar como uma montanha é adquirir
uma consciência ecológica profunda. É aprender que não precisamos de aparelhos
sofisticados como “plataformas vibratórias” e sim de caminhadas ao ar livre, de
água no corpo, de mais calma com a vida. Meu médico brincava, mas estava
certíssimo ao me aconselhar a observar a natureza e o comportamento da vaca.
Pense como uma montanha, ou como uma vaca, tanto faz, mas mude. Você é parte
deste universo.
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