Amigona. Dessas de uma vida inteira. A
Sandra era assim mesmo, curiosíssima, gostava de pormenores, ai! que aflição de
ser interrompida tantas vezes naquilo que estava discursando superempolgada e
lá vinha a Sandra, peraí, Misa, será que
essa moça que você está falando não é uma que tem um irmão que uma vez nós
fomos viajar e ele estava com um amigo,
aí quem interrompia era eu, não, Sandra,
ela não tem irmãos, tentava retomar a marcha, ela continuava, mas... não desistia. Ou então, quando ela é quem estava
contando um fato e eu escutando, aí ela dizia assim, o fulano, você sabe quem é, não sabe? E eu, não, não conheço, mas continua, vai
e ela, sabe sim, Misa, olha, você conhece
a Célia (faz de conta que é Célia), não conhece? E eu, A Célia, a do bazar? Ela
sorria feliz porque conseguia que eu conhecesse, sim, ela mesma. Bom, ela, eu de fato conhecia. Pois então, a irmã da Célia, a Gertrudes, é casada com um irmão do
fulano... (o protagonista da história que ela estava contando). Aí já era demais. Sandra, eu só conheço a Célia do bazar. A Gertrudes, o irmão, o cunhado
e a avó eu não conheço. Que delícia!
Fizemos muitas viagens juntas, que
saudades! Subimos e descemos a rua do castelo em Edimburgo inúmeras vezes (que
chique!), atravessamos os parques, fizemos compras. Ela me dizia, Misa, é lã pura, olha só! E aí peguei a
mania de sempre ler as etiquetas de roupas, de lã ou de outras fibras. Quando
vou comprar qualquer peça, nunca me esqueço de ler a etiqueta, aprendi com ela.
Naquela azáfama sempre parávamos para o café da tarde, essa expressão ficou
sagrada para nós, sempre teria que haver uma parada para o lanche, um café
preto com um pedaço de torta. Compartilhávamos o café da tarde e nossa amizade
com conversas intermináveis sobre tudo. Ela, evangélica e eu, católica, sempre
tendo Jesus em nossos corações. Em nossas viagens, nunca fomos de aproveitar a
noite, de boates, de baladas nem de grandes aprontações, nossas aventuras
cheias de simplicidade e alegria eram durante o dia. Lembro-me de certa vez,
quando fomos conhecer Porto Seguro. Na primeira manhã que fomos à praia, com
todo o grupo animadíssimo para tomar sol, caipirinha e dançar lambada,
perguntamos ao guia, Jorge (faz de
conta), qual a praia mais quente daqui, a mais cheia de gente, de
música e lambada? Ele, todo satisfeito nos indicou. Esperamos que todos
partissem para a tal praia e tomamos a direção contrária, ou seja, a da praia
mais tranquila, onde pudéssemos conversar, rir, aproveitar o sol, ler, correr, tomar
uma cervejinha sim, porque ninguém é de ferro, mas sem aquele frenesi todo do
turista que quer conhecer, aproveitar e provar de tudo. Ainda rimos muito
quando nos lembramos de três homens que faziam parte de nosso grupo e que,
segundo a Sandra, não viram nada da viagem porque já no avião começaram a beber
e não pararam até o último dia. Raramente conseguiam chegar a algum lugar,
sempre trocando as pernas e falando com dificuldade. Que bobeira!
A Sandra era a rainha dos “ice”. Adorava
acrescentar um ice em tudo. Por exemplo, de minha prima que era um pouco devagar
para carregar malas, a Sandra dizia, a Musa
parecia uma rainha, ficava naquela reizice toda, só venha a mim, dando
ênfase no iiice. E de mim, que sempre fui meio refratária a novos integrantes
de uma conversa, a Sandra dizia, a Misa,
então, é de uma matice (matice significando “do mato”) sem fim, sempre encompridando o ice para cima.
Amiga querida, sempre presente nos
momentos alegres e nos tristes, como no frio de dois junhos, quando tivemos que
velar meu pai e depois minha mãe no meio de lágrimas e da maior friice. Sempre
a Sandra, meu tipo inesquecível. Que saudades da Sandra!
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