sexta-feira, 25 de março de 2016

Delicadezas de Deus






Quando minha mãe ficou grávida do sexto filho, foi a maior festa! Por quê? Porque ela tinha certeza de que a fábrica já havia fechado, palavras dela. Fernando já estava grandinho. Nós, as duas primeiras filhas, acompanhamos aquela espera com ansiedade. Éramos as duas mais velhas, depois mais três irmãos homens. Aí, disse a mamãe que rezou assim pra Deus: Deus, o que vier tá bom, o Senhor sabe que fico feliz de qualquer maneira, mas ... mas ... eu gostaria muito de ter uma menina porque já estou com saudade de ter menina, veja bem, foram as duas mais velhas, depois três meninos em seguida. Então, já que escapou mais este filho, uma menininha, pode ser? Tem outra coisa, é um segundo pedido, as duas mais velhas são loiras de olhos azuis e eu tenho muita vontade de ter uma menina moreninha, de olhos castanhos assim como o menino mais velho e o mais novo (o do meio também era loiríssimo de olho azul), para ficar meio a meio, entende?Amém.
Quando a mamãe fez a oração já estava grávida de aparecer a barriga, então se fosse menino ou menina, já estava lá, não é? Mas, como dizem que pra Deus o tempo é um só, não importa se passado, presente ou futuro, Deus mandou uma menina e moreníssima, bem diferente de nós duas mais velhas, do jeito exato que ela pediu.
No dia do nascimento de minha irmã aconteceu um fato que não esqueço: estávamos na escadaria da igreja, nós os outros filhos e meu pai que recebia os cumprimentos de um colega de trabalho. Então veio chegando, de mansinho, numa delicadeza que só um pintor impressionista conseguiria registrar, uma chuva em camadas, quero dizer, eu sabia que a chuva iria chegar até nós, dessas finíssimas desde lá da montanha até a igreja. Eu usava um sapatinho branco que adorava. Era abertinho nas pontas e no calcanhar, Chanel, como se diz, tinha um botãozinho branco do lado. Ficou registrado.    
Muitos anos mais tarde, lá veio minha mãe pedindo a Deus mais coisas. Pediu que suas três noras se chamassem “Maria, Ana e Isabel” e não é que teve duas “Anas Marias” e uma “Ana Isabel”? Pois é, essa era minha mãe. E Deus, bem, para compensar muitas outras tristezas que ela teve, encomendou essas delicadezas para ela. Acertadíssimo, justíssimo, ela merecia.   




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