quinta-feira, 3 de março de 2016

De volta ao passado: Cine Presidente de Itajubá




Os mais novos não se lembram, mas nós itajubenses tivemos um cinema na cidade que fez parte importante de nossas vidas adolescentes, que povoou nosso imaginário encantado com os filmes da época. Quem não se lembra dos adoráveis filmes da Hayley Mills, Audrey Hepburn, Ben Hur, A Noviça Rebelde, os primeiros filmes de OO7, com o bonitão do Sean Connery, os filmes western spaghetti com Giuliano Gemma, aquele do O Dólar Furado, O Bebê de Rosemary e tantos outros mais? Pois é. Não víamos a hora de chegar domingo para assistir às matinês das 4 ou mesmo às sessões da noite. Vale lembrar que não existia celular naquela época, e, portanto nossa interação era a mais humana possível, era aquela da cara a cara, e lá, já instaladas confortavelmente nas poltronas rosas e azuis do Cine Presidente, aguardávamos ansiosas que o filme começasse.
            Qual não foi a surpresa do nosso grupo de WhatsApp quando minha prima Musa Ferrer discorreu diligentemente sobre o saudoso Cine Presidente, ressuscitando lembranças fantásticas que beiravam ao lirismo, e, aliás, muito bem lembrado pela Laís Medeiros, lembranças tais que fariam Proust morrer de inveja. Musa nos fez viajar no tempo, trazendo à tona detalhes deliciosos que pareciam já enterrados definitivamente em um passado pra lá de remoto. Ela nos fez lembrar das músicas de Ray Connif que compunham o ambiente perfeito antes do momento mágico da cortina se abrir, aquela cortina de chitão estampadinha, meio azul e meio roxa, aquela indefectível cortina enorme estampada, a mesma de sempre até o último dia de vida do cinema. Praticamente transcrevo a fala da Musa, deixando-nos deliciadas com o seu relato.
            E as poltronas rosas e azuis, os chicletes embaixo das cadeiras? E a charmosa “bomboniere” pequeníssima lá no cantinho ao pé da escada que conduzia ao salão? Era lá que nós comprávamos Mentex, dadinhos, balas chitas em papéis amarelos e verdes, chocolates croquetes, em forma de moedas, chocolápis, chicletes Ping pong com figurinhas, e outras guloseimas da época! E o bebedouro próximo à “bomboniere”, lugares que serviam de desculpas para ver quem nos interessava? E ainda tinha o folhetinho que nos davam na entrada do cinema com propagandas e descrição dos próximos filmes! Muitos garotos e garotas faziam aviõezinhos desses folhetinhos e os lançavam no ar enquanto as luzes ainda permaneciam acesas.
            Quase ninguém se lembra, mas as freiras levavam as internas do colégio nas matinês de domingo, dependendo do filme, é claro, por exemplo, com Brigitte Bardot, nem pensar, né? E as meninas ainda iam de uniforme de gala do Colégio Sagrado Coração de Jesus, fazendo a alegria dos moços que faziam um cortejo para vê-las passar no caminho! Anos dourados da inocência!
            Nos filmes de longa metragem havia o Ato I e II, e aí faziam uma pausa para trocar os rolos dos filmes. As luzes eram acesas e a bagunça se formava, com aviõezinhos que voavam por todo o lado, e mais idas e idas à “bomboniere” para a alegria do dono, e também idas aos toaletes sempre na desculpa de procurar pelos paqueras.
            Infelizmente, há que se lembrar das coisas tristes e ruins da década de 60 quando não se permitia a entrada de negros no cinema. Verdade verdadeiríssima contada por uma amiga que se lembra quando foi discriminada na entrada do Cine Presidente.  Mas ela mesma complementou que o grupo de amigos fazia o maior escarcéu na porta do cinema sempre no intuito de defender a moça e os demais negros para que pudessem entrar para assistir ao filme. 
            Em apresentações de grandes filmes como A Noviça Rebelde, Ben Hur e El Cid, vendia-se mais entradas do que assentos e os desafortunados que já não encontravam mais lugares vagos, sentavam-se mesmo no chão dos três corredores, achando tudo uma maravilha! Os casais de namorados acomodavam-se sempre nas duas laterais de cadeiras com fileiras menores que a fileira central. As músicas clássicas de Ray Connif, Paul Mauriat e Glenn Miller eram os anfitriões sonoros para a entrada triunfal de todos que desfilavam no tapete vermelho dos corredores. Torcíamos para que um rapaz alto não se sentasse na cadeira à nossa frente para não atrapalhar nossa visão, mas se isso acontecia, pedíamos para o rapaz abaixar-se em sua cadeira, e com sorte, quase sempre éramos atendidas. O lanterninha era o terror, sempre trazendo um retardatário e tirando nossa concentração no filme e atrapalhando os casais de namorados ...
            Para finalizar, Musa nos lembra que o cheiro e o barulho do saco de pipocas incendiavam o recinto do cinema, mas eram presenças imprescindíveis no enredo de cada filme! 

            Todo lugar, toda cidade tem uma história e muito desta história pode ser contada pelo seu patrimônio físico e cultural, pelas praças, jardins, coretos, teatros, igrejas, cinemas e pelas pessoas que frequentavam esses lugares. Feliz o povo que valoriza e luta pela preservação de seu patrimônio físico e cultural! Feliz o povo que valoriza sua história! Infelizmente já perdemos em Itajubá grande parte dos casarões, dos teatros e cinemas, então o que nos resta se não os fatos contados por quem viveu estas histórias e testemunhou-as? Parabéns à Musa Ferrer Ferreira por nos enriquecer com tão gratas lembranças permitindo-nos esta deliciosa viagem ao passado e revivendo momentos inesquecíveis no Cine Presidente! Parabéns por preservar a memória cultural de Itajubá e por representar tão dignamente a cidade onde nasceu ao longo de toda sua jornada esportiva e, no momento, já selecionada para representar o Brasil nas Olimpíadas e Paralimpíadas Rio 2016 como árbitra internacional de “Tênis de Mesa”!. Valeu Musa!           

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